5 de mai. de 2010

Língua materna ou língua madrasta, Daniele Ribeiro

O escrito a seguir estava perdido aqui entre minhas muitas produções/recordações do período acadêmico. Hoje, ao procurar um material que escrevi sobre o conto O espelho, de Machado de Assis, tive a alegria de encontrar um artigo sobre ensino de língua materna. Leiam aqui e, se possível, por meio de comentários e críticas, me ajudem a torná-lo melhor.

LÍNGUA MATERNA OU LÍNGUA MADRASTA?

A Língua Portuguesa é a nossa língua-mãe: a utilizamos desde as primeiras palavras que aprendemos. Sendo assim, parece haver uma grande incoerência quando falantes nativos de Português são levados a aprender sobre a língua que já fazem uso. Contudo, o objetivo central de se ensinar língua materna ao falante é ajudá-lo a desenvolver sua competência comunicativa, expandir a capacidade de empregar adequadamente a língua nas diversas situações de comunicação do dia a dia. O grande problema está em como se dá essa aprendizagem: no nosso caso, somos apresentados, com certo estranhamento, à Gramática, uma “senhora” dura e intransigente que insiste em nos fazer engolir suas regras. E são muitas as tais regras! Elas nunca acabam e ficamos com a impressão de que nós nunca as dominaremos: quando ameaçamos triunfar, surgem, sarcáticas, as exceções...
Sem o objetivo principal de provocar reflexões, o que deveria ser o centro do estudo, aprender Gramática torna-se sinônimo de aumentar o conhecimento técnico a respeito do Português. E se não nos dá liberdade para pensar, repensar, refletir e agir, sempre com criatividade, desconhecemos e não nos vemos como filhos legítimos dessa língua. Somos seus enteados.  Língua madrasta!
É verdade que o papel da escola é ensinar a língua padrão, criando condições para que ela seja de fato aprendida. O domínio do Português deve ser aliado a um determinado grau de aquisição da escrita e da leitura. É fato que o aluno que lê mais, fala e escreve melhor, além de se aprimorar em criticidade.  Se ao ser questionado sobre o que é certo ou errado, a resposta for embasada somente pelas normas elencadas no livro das regras  e nos dicionários, revela-se então uma atitude problemática do que é realmente uma língua: lugar de interação, de prazer, de crítica, de fruição e de encontro do sujeito consigo mesmo: língua é colo de mãe.
Ensinar com o intuito de instrumentalizar o falante/leitor/escritor para a adequação e domínio da variedade culta demanda esclarecimento sobre variedades e preconceitos linguísticos para que “os erros” só sejam considerados erros se o critério de avaliação for social.
A Gramática deveria mostrar o lado lógico, inteligente, racional dos processos linguísticos. Mas não é assim que ela tem sido ensinada. Sobra um amontoado de regras que não se relacionam com a língua viva do cotidiano, das músicas, dos textos de jornais, das revistas, dos blogs...
A Gramática poderia ser mãe se nos atraísse a ler, escrever, discutir, reescrever, reler e reescrever mais, para escrever e ler sempre de forma mais requintada. Todavia, se faz madrasta quando nos repele e com suas gramatiquices tenta nos roubar o censo crítico e equacionar a magia da Língua materna.

Daniele Soares Ribeiro

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