Joaquim Maria Machado de Assis nasceu no Rio
de Janeiro em 21 de junho de 1839 e faleceu na mesma cidade em 29 de setembro
de 1908. Filho de um mulato carioca e de uma imigrante açoriana, Machado de
Assis era um mestiço de origem humilde. Frequentou apenas a escola primária,
pois precisou trabalhar desde a infância, e mesmo sem ter acesso a cursos
regulares aprendeu sozinho francês, inglês e alemão.
Estreou na literatura em 1855, aos 15 anos de
idade, com a publicação do poema Ela na revista Marmota Fluminense. Trabalhou
como cronista, contista, poeta e crítico literário. Com esse currículo, foi
reconhecido como intelectual. Assumiu vários cargos públicos ao longo de sua
vida, o que lhe permitiu se entregar à vida de escritor.
Sua extensa e variada obra constitui-se de
romances, peças teatrais, contos, poemas, sonetos e crônicas. A obra ficcional
do escritor tendia para o Romantismo em sua primeira fase, mas num segundo
momento voltou-se para o Realismo, tendo a obra Memórias Póstumas de Brás
Cubas, de Machado, marcado o início desta fase no Brasil.
"O Alienista" -
Análise do conto de Machado de Assis
Alienista: nome dado, antigamente, ao profissional dedicado ao estudo da loucura.
Uma espécie de psiquiatra.
“O alienista” ajuda a inaugurar a
fase realista de Machado de Assis e apresenta diversas características que a
obra desse escritor apresentará a partir de então, tais como a análise psicológica e a crítica social.
Devido a sua extensão e outras características, alguns críticos afirmam
tratar-se de uma novela; mas como este texto não apresenta as principais
características de uma novela (uma maior preocupação com o enredo,
superficialidade psicológica das personagens, etc), “O Alienista” é mais
comumente classificado como um conto.
Com o narrador onisciente em terceira pessoa, Machado de Assis consegue
mostrar e explorar o comportamento humano além das aparências, expondo com
grande ironia toda a vaidade e egoísmo do homem.
Alienista: nome dado, antigamente, ao profissional dedicado ao estudo da loucura.
Uma espécie de psiquiatra.
“O alienista” ajuda a inaugurar a
fase realista de Machado de Assis e apresenta diversas características que a
obra desse escritor apresentará a partir de então, tais como a análise psicológica e a crítica social.
Devido a sua extensão e outras características, alguns críticos afirmam
tratar-se de uma novela; mas como este texto não apresenta as principais
características de uma novela (uma maior preocupação com o enredo,
superficialidade psicológica das personagens, etc), “O Alienista” é mais
comumente classificado como um conto.
Com o narrador onisciente em terceira pessoa, Machado de Assis consegue
mostrar e explorar o comportamento humano além das aparências, expondo com
grande ironia toda a vaidade e egoísmo do homem.
Machado de Assis coloca em questão nesse conto as fronteiras entre o que é normal e o que é anormal através de um
médico que se esforça em tentar entender os distúrbios psicológicos da
população. Dessa forma, pode-se dizer que há uma proximidade entre a personagem
do Dr. Simão Bacamarte com o próprio Machado de Assis, uma vez que o autor
também está interessado em analisar as atitudes das pessoas e suas relações
sociais.
Em torno da figura quase mítica do Dr. Bacamarte, que segue com rigidez e
frieza suas teorias científicas, Machado de Assis dispõe outras personagens
ricas em detalhes. Dentre toda espécie de tipos sociais, aparece D. Evarista,
esposa dedicada, que ama e admira o marido. Porém, por mais que ela respeite
todo o conhecimento e sabedoria do alienista, ela não segue suas recomendações
médicas e tem ciúmes da dedicação que ele tem aos estudos em detrimento dela.
Em contrapartida, temos Crispim Soares, que é o botânico da cidade. Ele admira,
respeita e segue tudo o que o Dr. Bacamarte diz, porém, apenas por interesses
próprios, de forma a conseguir vantagens através do alienista. Além dessas duas
personagens, temos o barbeiro Porfírio, homem que representa o político
preocupado somente em obter vantagens pessoais.
Estrutura da obra
Trata-se de um conto um tanto
longo, estruturado em treze capítulos. Quanto à montagem, é interessante
observar que Machado de Assis se fundamenta em possíveis "crônicas".
Observe que, com alguma freqüência, ele se refere aos "cronistas" e
às "crônicas da vila de Itaguaí" como, aliás, tem inícioO
Alienista:"As
crônicas da vila de Itaguaí dizem que em tempos remotos vivera ali um certo
médico, o Dr. Simão Bacamarte, filho da nobreza da terra e o maior dos médicos
do Brasil, de Portugal e das Espanhas.".
Também o fecho do conto
apresenta a mesma referência:"Dizem os cronistas que ele
morreu dali a dezessete meses, no mesmo estado em que entrou, sem ter podido
alcançar nada".
Foco narrativo
O narrador é em 3ª pessoa,
portanto, onisciente. A intenção do narrador é a análise do comportamento
humano: vai além das aparências e procura atingir os motivos essenciais da
conduta humana, descobrindo, no homem, o egoísmo e a vaidade. A
intencionalidade crítica do narrador não se reflete somente ao ser humano de
forma geral. Ele critica, também, a postura do cientista e do extremo
cientificismo do final do século XIX. Conseqüentemente, o narrador termina por
criticar a Escola Naturalista.
Características de
Machado de Assis encontradas no contoO Alienista
1.Frases Curtas.
2.Linguagem correta
3.Conversa com o Leitor.
4.Análise psicológica das personagens
Casa de Orates -"Casa de Loucos". E,
aparentemente, ele deseja servir à ciência. Porém, por trás dos atos
aparentemente bons, surpreende-se a intenção verdadeira de Bacamarte:atingir a
glória e ser a pessoa mais importante de Itaguaí. É Machado desmascarando a
hipocrisia humana.
O objetivo de Simão
Bacamarte -Conhecer
as fronteiras entre a razão e a loucura. Na realidade, ele pretendia buscara
glória, através de um estudo da patologia cerebral.Obs.: através de Bacamarte,
Machado de Assis critica os cientistas da época, que, para ele, não tinham os
conhecimentos suficientes e necessários. Esse conhecimento era bazófia (da boca
para fora).
Simão Bacamarte e o
sanatório- A
aprovação cessa quando Simão Bacamarte recolhe, na Casa Verde, pessoas em cuja
loucura a população não acredita. Para Simão Bacamarte, o homem é considerado
um caso que deve ser analisado cientificamente.Obs.: Machado de Assis critica a
postura cientificista que não vê o ser humano na sua integridade corpo x alma.
As teorias de Simão
Bacamarte
Teoria 1:são loucos aqueles que apresentarem um
comportamento anormal de acordo com o conhecimento da maioria.
Teoria 2:ampliou o território da loucura:"A
razão é o perfeito equilíbrio de todas as faculdades, fora daí, insânia,
insânia e só insânia."
Teoria 3:os loucos agora são os leais, os justos, os
honestos e imparciais. Dizia que se devia admitir como normal o desequilíbrio
das faculdades e como patológico,o seu equilíbrio.
Teoria 4:o único ser perfeito de Itaguaí era o
próprio Simão Bacamarte. Logo, somente ele deveria ir para a Casa Verde.
Tempo / Ação
Percebe-se que toda a história
se passa no passado, havendo o uso do flashback: "As crônicas da Vila de
Itaguaí dizem que, em tempos remotos, vivera ali um certo médico: o Dr. Sr.
Bacamarte.
"O tempos remotos" a
que se referem as crônicas, pelas indicações dadas, se remontam à primeira
metade do século XVIII (= reinado de D. João V).
A ação transcorre, como já se
viu, em Itaguaí, "cidadezinha do Estado do Rio de Janeiro, comarca de
Iguaçu", conforme declara o crítico Massaud Moisés em nota de pé-de-página
da edição que estamos consultando.
O conto
1.Aspectos de crítica sócio-política: Na
figura do Porfírio, analisa-se o político sempre buscando vantagens pessoais.
No povo da cidade de Itaguaí, percebe-se a submissão, a fácil manipulação,
bastando, para isso, conhecimento ou liderança.
2.Humor amargo de Machado de Assis - visão
irônica e amarga que enfatiza aspectos negativos denunciadores da frustração
humana: o autor utiliza o humor para criticar a hipocrisia humana, provocada
por um sistema social regido pela falta de valores. O homem, para Machado, é
acima de tudo, ganancioso e movido pela intenção de poder. 3."Simão
Bacamarte aparece como símbolo de um saber duvidoso, pois não se revela senão
em estado de pânico em que põe o universo, quando ele procura determinar uma
norma geral de conduta para o comportamento humano,igualando, rasteiramente, todos
os indivíduos"."É a deformação do
"cientista" que toma como verdade absoluta os pressupostos da ciência
e comete, em seu nome, equívocos sucessivos sem dar pelo absurdo de suas
pretensões". Machado de Assis chama a atenção para a
relatividade da ciência. Observe-se que, a cada teoria que ele cria, ele pensa
estar diante de uma verdade absoluta para, em seguida, perceber que isso não é
verdade.
4.EmO Alienista, Machado de
Assis revela uma visão satírica e irônica da mentalidade cientificista que
marca o século XIX - O Naturalismo. O Realismo aproveita, também, nos seus
romances, algumas características filosófico-científicas da época. Porém,
condena os excessos do Naturalismo.
Personagens
Dr. Simão Bacamarte- é o protagonista da estória. A
ciência era o seu universo – o seu "emprego único", como diz.
"Homem de Ciência, e só de Ciência, nada o consternava fora da
Ciência" (p. 189). Representa bem a caricatura do depotismo cientificista
do século XIX (como está no próprio sobrenome). Acabou se tornando vítima de
suas próprias idéias, recolhendo-se à Casa Verde por se considerar o único
cérebro bem organizado de Itaguaí.
D. Evarista -é a eleita do Dr. Bacamarte para
consorte de suas glórias científicas. Embora não fosse "bonita nem
simpática", o doutor a escolheu para esposa porque ela"reuni
condições fisiológicas e anatômicas de primeira ordem", estando apta para
dar-lhes filhos robustos, são e inteligentes". Chegou a ser
recolhida à Casa Verde, certa vez, por manifestar algum desequilíbrio mental.
Crispim Soares -era o boticário. Muito amigo do Dr.
Bacamarte e grande admirador de sua obra humanitária. Também passou pela Casa
Verde, pois não soube "ser prudente em tempos de revolução",
aderindo, momentaneamente, à causa do barbeiro.
Padre Lopes -era o vigário local. Homem de muitas
virtudes, foi recolhido também à Casa Verde por isso mesmo. Depois foi posto em
liberdade porque sua reverendíssima se saiu muito bem numa tradução de grego e
hebraico, embora não soubesse nada dessas línguas. Foi considerado normal
apesar da aureola de santo.
Porfírio, o barbeiro -sua participação no conto é das mais
importantes, posto que representa a caricatura política na satírica machadiana.
Representa bem a ambição de poder, quando lidera a rebelião que depôs o governo
legal. Foi preso na Casa Verde duas vezes; primeiro, por Ter liderado a
rebelião; segundo, porque se negou a participar de uma Segunda revolução:
"preso por Ter cão, preso por não Ter cão" (pg 229).
Outros figurantes aparecem no
conto. Cada um representando anomalias e possíveis virtudes do ser humano. Há
loucos de todos os tipos no livro. Daí a presença de tanta gente...
Enredo
O protagonista, depois de títulos e feitos conquistados na Europa (apesar de
suas ações aparentemente disparatadas, a personagem é alguém amplamente aceito
pelo Estado, estabelece-se em Itaguaí com a ideia de criar um manicômio (Casa
Verde), que lhe seria um meio de estudar os limites entre razão e loucura. No
entanto, sua metodologia de estudo é que o diferenciará radicalmente de Machado
de Assis. Em sua frieza analítica, Simão assumirá um tom tão rígido que acabará
se tornando caricaturesco, falho e absurdo (parece haver aqui critica ao rigor
analítico do determinismo cientificista que andava em moda na literatura da
época de Machado de Assis, principalmente a de aspecto naturalista). O problema
é que o especialista vem investido do apoio oficial de todo o aparelho do
Estado, o que faz alguns críticos enxergarem nessa obra não uma preocupação com
a abordagem psicológica, mas uma crítica de alcance político. O conto seria,
portanto, uma forma de questionamento contra o autoritarismo massacrante do
sistema.
Os primeiros internados no hospício
foram casos notórios e perfeitamente aceitos pela sociedade de Itaguaí. Mas
começa a haver uma sequência de escolhas que surpreendem os cidadãos da pequena
cidade. O primeiro é o Costa, que havia torrado sua herança em empréstimos que
se tornaram fundo perdido. O pior é que se sentia envergonhado de cobrar seus
devedores, passando a ser até maltratado por estes. Depois foi a prima do
mão-aberta, que tinha ido defender seu parente com uma mirabolante história de
que a decrepitude financeira se devia a uma maldição (o mais hilário é que essa
mulher fora ao hospício para defender o primo e, após contar tal história,
acaba sendo na hora internada. Aumenta, aqui, o terror sobre uma figura tão
déspota e traiçoeira como Simão Bacamarte, pelo menos na visão do povo de
Itaguaí).
Após esses, é internado o barbeiro
Mateus (profissional que faz albardas, ou seja, selas para bestas de carga. É
uma profissão bastante humilde, tanto que a palavra albarda também
significa humilhação. Há, portanto, uma
carga negativa associada a essa profissão. Ter isso em mente ajuda na
interpretação do episódio), que se deliciava em ficar horas admirando o luxo de
sua enorme casa, ainda mais quando notava que estava sendo observado. Essa
personagem serve para que reflitamos questões como a valorização exagerada do
status e até mesmo uma análise do preconceito, pois a maioria da cidade não
aceitava um homem de origem e trabalho humilde possuir e ostentar tanta
riqueza.
Apenas esses atos já foram
suficientes para deixar a cidade em polvorosa. Assim, todos anseiam pela volta
de D. Evarista, esposa de Simão Bacamarte, que havia ido para o Rio de Janeiro
como maneira de compensar a ausência do marido, tão mergulhado que estava em
seus estudos (é interessante lembrar a relação que o casal estabelece. Ela é
extremamente apaixonada, algumas vezes dramática (se bem que o narrador deixa
um tom de descrédito ao sempre afirmar que essa caracterização é baseada nos
cronistas da época). Ele é frio, unindo-se a uma mulher não preocupado com sua
beleza, mas com aspectos práticos, como a capacidade, o vigor para reprodução.
Chega até a bendizer o fato de ela não ser bonita, pois seria menos dor de
cabeça). Para os cidadãos, ela era a esperança de salvação daquele terror
constante e aparentemente arbitrário. Por isso, a maneira festiva com que foi
recebida.
No entanto, em meio a um jantar
em homenagem à salvadora senhora, Martim Brito, um jovem dotado de exibicionismo
de linguagem, faz um elogio um tanto exagerado: Deus queria superar a Si mesmo
quando da concepção de D. Evarista. Dias depois, o janota estava internado.
Logo após, Gil Bernardes, que
adorava cumprimentar todos, até mesmo crianças, de maneira até espalhafatosa, é
confinado. Depois Coelho, que falava tanto a ponto de alguns fugirem de sua presença.
Pasma diante de aparente falta
de critério, Itaguaí acaba tornando-se um barril de pólvora prestes a explodir.
Aproveitando-se dessa situação, o barbeiro Porfírio, que há muito queria fazer
parte da estrutura de poder, mas sempre tinha sido rejeitado, arma um protesto
com intenções revolucionárias (note que a questão é pessoal: Coelho tinha
negócios importantes com Porfírio que tinha sido interrompidos com a
internação, sem mencionar o sonho por poder da personagem é disfarçada em
preocupações altruístas). Bem machadiano esse aspecto dilemático da realidade).
Depois de ter seu requerimento
desprezado pela Câmara de Vereadores, une-se a vários outros descontentes. Há
um esmorecimento quando se descobre que Simão havia pedido para não receber mais
pelos internos da Casa Verde. Configura-se a ideia de que as inúmeras reclusões
não eram movidas por corruptos interesses econômicos.
No entanto, Porfírio consegue fôlego e institui uma insurreição, que recebe até
o seu apelido: Revolta dos Canjicas. Vão até a casa do alienista, mas este os
recebe, de sua sacada, de forma equilibrada e sem a mínima disposição em se
demover de sua metodologia científica. A fúria, que tinha sido momentaneamente
aplacada pela frieza do oponente, é instigada quando este lhes dá as costas e
volta aos seus estudos.
Providencialmente, a polícia da
época (dragões) surge com a intenção de sufocar o levante. O mais espantoso é
que, justo nesse momento em que o jogo parecia perdido para Porfírio, tudo se
volta a seu favor: os componentes da guarda, provavelmente enxergando injustiça
na ditadura científica, passam para o lado dos revoltosos. Era tudo o que o
líder mais queria – poder absoluto.
Surpreendentemente (ou não),
fortalecido, Porfírio esquece a Casa Verde e se dirige para a Câmara dos
Vereadores para destituí-la. Senhor supremo, no dia seguinte encontra-se com o
alienista, que já friamente (como de costume) esperava ser demitido.
Impressionantemente, o novo governante afirma que não vai meter-se em questões
científicas.
Configura-se aqui uma crítica a
tantas revoluções que ocorreram na História e que estão por ocorrer. Entende-se
que elas são na realidade movidas por interesses coletivos autênticos, mas que
acabam sendo manipuladas e servindo de trampolim para que determinadas pessoas
subam ao poder por outros motivos, mais egoístas.
Provavelmente todas essas ideias
passaram na mente de Simão no momento em que Porfírio veio expressar-lhe apoio
em seu trabalho sanitário. Tanto que pergunta quantos pessoas haviam morrido na
revolução. São os dois casos que descobre como matéria de estudo. O primeiro é
o fato de gente ter perdido a vida por um levante que tinha a intenção de
derrubar a Casa Verde e agora tudo ficar esquecido. O segundo é o Porfírio
antes se levantar ferozmente contra Porfírio e agora considerá-lo de extrema
utilidade para o seu novo governo. O que virá daí já se sabe.
Dias depois, 50 apoiadores da revolução são internados. Porfírio ficou
desnorteado, mais ainda porque um seu opositor, o barbeiro João Pina, levanta-se
contra. Na realidade, este não estava interessado em questões sociais, mas
tinha uma rixa pessoal com o outro barbeiro. Conseqüência: arma uma balbúrdia
tamanha que acaba derrubando o Canjica.
Mas o novo poder não destitui a
Casa Verde. Fortalece-a. Mais gente é confinada. Crispim, assistente e
bajulador do alienista, que apóia Porfírio no momento que pensava que Simão
havia caído. Depois o Presidente da Câmara dos Vereadores. O clímax deu-se
quando a própria esposa do alienista, extremamente preocupada com jóias e
vestidos, a ponto de não conseguir dormir por não saber como iria numa festa,
acaba sendo internada. Ao mesmo tempo que era a prova de que Bacamarte não
tinha intenções egoístas, pois até a própria consorte tinha se tornado vítima,
tornava também patente a arbitrariedade a que Itaguaí estava submetida.
Certo tempo depois, como num
feito rocambólico, a cidade recebe a notícia de que Simão determinou a soltura
de todos os “loucos” da Casa Verde. Na verdade, o cientista havia notado que
75% dos moradores estavam confinados. Estatisticamente, portanto, sua teoria
estava errada, merecendo ser refeita.
Esse recuo, além de demonstrar
um rigor científico louvável, pois demonstra que o protagonista não está
preocupado com vaidade, tanto que reconhece que erra, exibe mais elementos
interessantes para a interpretação do conto. Pode-se dizer que exibe uma
questão polêmica: quem é normal? O que segue a maioria? Se 75% apresentam
desvios de personalidade, desvios do padrão (era essa, finalmente revelada, a
regra que determinava quem era e quem não era são), então o normal seria não
seguir um padrão. Fora essa questão polêmica, deve-se perceber a força que o
Estado, por meio da Casa Verde (tanto é que mudavam os poderosos, mas o sistema
continuava o mesmo), assumia em determinar quem estava na linha e quem não
estava. Todos tinham de se encaixar a uma norma.
Enfim, dentro da nova teoria
(louco era quem mantinha regularidade, firmeza de caráter), o terror recomeça.
O vereador Galvão é o primeiro a ser internado, porque havia protestado contra
uma emenda da Câmara que instituía que somente os vereadores é que não poderiam
ser reclusos. Sua alegação era a de que os edis não podiam legislar em causa
própria. A esposa dedicada de Crispim é também alocada na Casa Verde. O
barbeiro fica louco. Um inimigo de Simão se vê na obrigação de avisar o
alienista do risco de vida que o cientista corria. Por tal desprendimento, na
hora acaba sendo confinado. Até Porfírio, volta a ser preso, pois, conclamado a
preparar outra revolta, recusa-se, pois se tocou que gente havia perdido a vida
na Revolta dos Canjicas para o resultado ser infrutífero. Ao ser preso, resumiu
bem sua situação: preso por ter cão, preso por não ter cão.
Alguns casos são interessantes.
Pessoas que se demonstram firmes em sua personalidade são consideradas curadas
quando exibem algum desvio de caráter. Assim foi com um advogado de conduta
exemplar que só não foi internado porque havia forçado um testamento a ter a
partilha do jeito que queria. Ou então quando a esposa do Crispim xinga-o ao
descobrir o verdadeiro caráter do marido.
Porém, fora esses casos, Simão
vai percebendo que seu segundo método era falho, pois ninguém naturalmente
tinha uma personalidade reta, perfeita. Com exceção dele próprio. É por isso
que, após muita reflexão e muita conversa com pessoas notórias da cidade,
principalmente o padre (que já havia sido internado), conclui que o único
anormal era ele próprio. A despeito dos protestos de muitos, inclusive de D.
Evarista, decide, pois, soltar todos mais uma vez e encerrar-se sozinho na Casa
Verde para o resto de sua vida.