Mostrando postagens com marcador 2º Ano. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador 2º Ano. Mostrar todas as postagens

15 de nov. de 2016

ANÁLISE LITERÁRIA “LUCÍOLA”, José de Alencar

ANÁLISE LITERÁRIA “LUCÍOLA”,
José de Alencar



José de Alencar é um dos nossos mais célebres e férteis romancistas. Dentre a obra desse memorável autor, "Lucíola", juntamente com “Senhora”, é um de seus mais famosos romances urbanos. Alencar se dedicou também ao chamado romance indianista, tais como "O Gurarani" e "Iracema"; aos romances regionalistas, como "O Gaúcho" e "O Sertanejo", e históricos, "As Minas de Prata" e "A Guerra dos Mascates".
Enquanto romance urbano, anterior ao aparecimento do Realismo em nossa literatura, ele é fundamentalmente uma crônica de costumes, um retrato da Corte ou da sociedade fluminense na segunda metade do século XIX. Ou seja o texto focaliza a época em que o próprio escritor viveu. Nesse sentido, é muito apropriado o comentário do crítico Alfredo Bosi sobre os romances urbanos de José de Alencar:
"Alencar, cioso da própria liberdade, navega feliz nas águas do remoto e do longínquo. É sempre com menoscabo ou surda irritação que olha o presente, o progresso, "a vida em sociedade"; e quando se detém no juízo da civilização, é para deplorar a pouquidade das relações cortesãs, sujeitas ao Moloc do dinheiro. Daí o mordente de suas melhores páginas dedicadas aos costumes burgueses em 'Senhora' e 'Lucíola'".
Em outras palavras, Alencar critica a sociedade que lhe é contemporânea, não a partir da perspectiva de uma transformação futura, mas na da nostalgia de um passado que só na ficção pode reviver plenamente. De qualquer modo, é em "Senhora" e "Lucíola" que atinge o ponto alto em termos de crítica social e procura se aprofundar na psicologia das personagens femininas, traçando o que se convencionou chamar de seus "perfis de mulher".

CARACTERÍSTICAS DA ESCRITA DE JOSÉ DE ALENCAR

·         Lirismo – não no sentido literário, mas no sentido de visão da realidade. Nesse aspecto, Alencar é um escritor eminentemente lírico, pois é delicado, terno, de sensibilidade fina, imaginação fértil, estilo cheio de graça e harmonia. A realidade, principalmente a natureza, sempre que possível, é embelezada poeticamente na sua pena. A maioria dos críticos concorda que ele criou seu estilo, expresso numa musicalidade toda sua.
·       Gosto pela descrição – a descrição parece ser o forte de Alencar, principalmente dessas três realidades: paisagem, personagem e vestuário feminino. A descrição da paisagem sobressai em qualidade e quantidade nos seus romances regionalistas e indianistas. Mesmo nos urbanos, sempre haverá um parêntese reservado para a paisagem (natureza) ou cenário (salões, ambientes).
·         Comparações – as comparações de Alencar, geralmente, referem-se aos personagens, ora em seus detalhes físicos, ora em seus estados de alma, ora em seus atributos morais.
·         Desarmonias – é mais ou menos aquilo que atrás se chamou de ilogismo. Lá, tal ilogismo foi mostrado como uma das características românticas no livro, Aqui, as “desarmonias” aparecem como uma das características do estilo alencariano, “é o choque entre o mal e o bem”, diz Antônio Cândido.

LUCÍOLA
            Lucíola é o quinto romance de Alencar e o primeiro que ele denominou de “perfis de mulher”( Lucíola, Diva e Senhora ). Situa-se entre seus romances urbanos, que representam um levantamento da nossa vida burguesa do século passado mais considerável do que o levado a efeito por Machado de Assis, na opinião de Heron de Alencar. Fixam o Rio de Janeiro da época, com a sua fisionomia burguesa e tradicional, com uma sociedade endinheirada que frequentava o Teatro Lírico, passeava à tarde na Rua do Ouvidor e à noite no Passeio Público, morava no Flamengo, em Botafogo ou Santa Teresa e era protagonista de dramas de amor que iam do simples namoro à paixão desvairada.
O romance Lucíola é lançado em 1862 e causou viva polêmica porque trazia como protagonista uma cortesã de nome Lúcia. Mais do que isso: falava da reabilitação dessa cortesã pelo amor. Hoje esse enredo talvez não provocaria reações tão exacerbadas do público. Mas naquela época tal temática representou um escândalo porque para os rígidos padrões de conduta social e moral da época isso era tido como inaceitável. A obra foi rotulada de imoral. Mas a polêmica não pára apenas na acusação de imoralidade, porque para muitos a obra não passava de mera imitação de A Dama das Camélia de Alexandre Dumas Filho. Dessa forma, a cortesã Lucia não passava de uma imitação do comportamento da cortesã Margarida, protagonista de A Dama das Camélias.     

 

CARACTERÍSTICAS ROMÂNTICAS DA OBRA

·         Subjetivismo – o mundo do romântico gira em torno de seu “eu”: do que ele sente, do que ele pensa, do que ele quer. Por isso o poeta e o personagem na ficção romântica estão em contínua desarmonia com os valores e imposições da sociedade e\ou da família. Em Lucíola encontram-se pelo menos duas grandes manifestações desse subjetivismo romântico. A primeira está na própria estrutura narrativa do romance, onde temos um narrador de primeira pessoa, em que a história é narrada do ponto de vista de uma única pessoa. A Segunda está na oposição indivíduo X sociedade. Para Edgard Cavalheiro “o divórcio entre o homem e o meio é a pedra de toque de um autêntico espírito romântico. Sobrepor sentimento à razão, o entusiasmo ao raciocínio, o subjetivismo ao objetivismo, são diretrizes que marcaram a escola”. No romance , Paulo e Lúcia ora se insurgem contra as convenções sociais, ora satisfazem essas mesmas convenções, embora sempre reafirmando o próprio “eu”e fazendo sua personalidade.
·         Exaltação do amor – o amor é a mola mestra da ficção romântica em prosa e verso. Mas o amor sublime, alheio às convenções sociais, feito de sacrifício e, às vezes, de heroísmos. Em Lucíola, a temática central está exatamente nesta exaltação do amor como força purificadora, capaz de transformar uma prostituta numa amante sincera e fiel. E o romance termina com uma patética declaração de amor, balbuciada por uma prostituta regenerada por esse mesmo amor, momentos antes de sua morte.
·         Amor e Morte – em defesa do direito de amar e ser amado, os heróis e heroínas românticos são capazes de sacrifícios e renúncias incríveis. Diante da impossibilidade da concretização desse amor mais forte, a atitude entre os românticos é o desejo de morte: morte natural ou suicídio.
·         Sentimentalismo melancólico – o romântico é acima de tudo um sentimental. Os heróis são choramingas, e colocam o sentimento acima da razão, elegendo o coração como norma suprema de conduta pessoal e social. O comportamento das personagens é imprevisível, dependendo de seus estados de alma. Em Lucíola, por exemplo, um mínimo contratempo é suficiente para lançar Paulo e Lúcia na mais profunda tristeza.
·         Ilogismo – para Domício Proença, tal ilogismo na literatura romântica “leva, inclusive, a uma instabilidade emocional traduzida em atitudes antitéticas ou paradoxais: alegria e tristeza, entusiasmo e depressão.” O comportamento de Lúcia ora excêntrico ora virtuoso; e o comportamento de Paulo, generoso e mesquinho, compreensivo e pilantra : tudo isso dá à intriga do romance um atrativo todo especial que, por sua vez, ora atrai ora aborrece o leitor.
·         Outras características – imaginação e fantasia, culto da natureza, senso de mistério, exagero.

NARRADOR
·           Romance de primeira pessoa, ou seja, quem narra a história não é Alencar diretamente. Ele o faz por meio de um narrador-personagem que viveu os episódios, no caso, Paulo. Paulo, através de cartas dirigidas a uma senhora (por quem o autor se faz passar) conta uma história de amor acontecida há seis anos entre ele e Lúcia. Na estrutura narrativa de Lucíola, portanto, pode-se observar o seguinte:
·         Há um autor real, José de Alencar;
·         Um autor fictício, a senhora G.M., destinatárias das cartas de Paulo;
·         Um narrador, Paulo, com a incumbência e o privilégio de ordenar os fatos, comentá-los e tirar-lhes conclusões. À medida que transmite os fatos, vai fornecendo ao leitor elementos para a análise de Lúcia e dele mesmo.
Ø  No romance, os fatos são apresentados sob dois ângulos diferentes:
·         O de Paulo-personagem, que transmite ao leitor as sensações vividas com Lúcia;
·         O de Paulo- narrador que, por vezes, interrompe a narrativa fazendo reflexões ou dirigindo-se à destinatária de suas cartas.

 

TEMPO

·           A história se passa no século passado: 1855.
·           Numa leitura atenta, o leitor percebe o Rio de Janeiro da época de D.Pedro II, com seus salões, burguesia, seu vestuário, etc.
·           Tempo narrativo, ele é eminentemente “cronológico”, ou seja, em Lucíola os acontecimentos se sucedem numa ordem quase normal, com uma seqüência natural de horas, dias, meses e anos. Só há um momento em que o fluxo narrativo retroage: quando Lúcia narra a Paulo o seu passado.

 

ESPAÇO

·           Rio de Janeiro: há referências de seus bairros(Santa Tereza), ruas(das Mangueiras), população, festas(a da Glória), teatros, lojas, etc.
·           É curiosa a relação entre os locais e o comportamento amoroso-sexual de Paulo e Lúcia, agindo aqueles no sentido de aproximação ou afastamento, de maior ou menor realização do casal.

PERSONAGENS

·         Lúcia – sua principal característica é a contradição. Como cortesã era a mais depravada. Basta que se lembre da orgia romana em casa de Sá. No entanto a prostituição era-lhe um tormento constante, já que não se entregava totalmente a ela. E os atos libidinosos constituíam para ela verdadeira autopunição aliada ao angustiante sentimento de culpa. Coexistem nela duas pessoas: Maria da Glória, a menina inocente e simples, e Lúcia, a cortesã sedutora e caprichosa.

Lúcia

Maria da Glória

Mulher

Menina

Depravação, luxúria

Pureza, ingenuidade

Sentimento de culpa

Dignidade

Prostituição

Inocência

Caprichosa, excêntrica

Simples, meiga

Rejeita o amor

Tende pra o amor

demônio

Anjo


·         Paulo – provinciano de Pernambuco, 25 anos,
veio ao Rio de Janeiro tentar se estabelecer. O romance não esclarece se ele é formado ou não. Espírito observador e sensível, foi o único a compreender o estranho caráter de Lúcia, embora ficasse na dúvida sobre sua real personalidade. É um ingênuo personagem romântico. Apesar de se declarar pobre, vive byronicamente, de sonhos e de amor.
·         Dr. Sá e Cunha – amigos de Paulo, sendo aquele desde a infância. Encarnam a moral burguesa e suas máscaras: austera com os outros, benigna consigo. Não possuem personalidade bem delineada no livro. Ambos vêem em Lúcia apenas a prostituta.
·         Couto e Rochinha – O primeiro é um velho dado a jovem galante. Encarna a obsessão sexual e a velhice. Representa a sociedade que explora e corrompe. Foi ele quem aproveitou a necessidade e a inocência de Lúcia. O segundo é um jovem de 17 anos, tez amarrotada, profundas olheiras, velho prematuro. Libertino precoce.
·         Laura e Nina – são meretrizes, mas sem duplicidade de caráter. Não são capazes de “descer tão baixo”, porém não possuem a “nobreza e altivez” da protagonista.
·         Jesuína e Jacinto –aquela, é uma mulher de 50 anos, seca e já encarquilhada. Foi quem recolheu Lúcia quando seu pai a expulsou de casa e a iniciou na prostituição. Este, é um homem de 45 anos, e “vive da prostituição de moças pobres e da devassidão de homens ricos”. Por seu intermédio, Lúcia vendia as jóias ricas que ganhava e enviava dinheiro à família pobre. É quem mantém a ligação misteriosa no livro, entre Lúcia e Ana. Enfim, é quem cuida dos negócios dela.
·         Ana – é a irmã de Lúcia, que a fez educar num colégio até os doze anos como se fosse sua filha. Lúcia tenta casá-la com Paulo para ser uma espécie deperpetuação e concretização de seu amor por ele.
ENREDO

·         Chegada de Paulo Silva ao Rio de Janeiro, em 1855, com a intenção de aí se estabelecer.

·          No dia de sua chegada à corte, após o jantar, sai em companhia de um amigo para conhecer a cidade.

·         Na rua das Mangueiras vê passar em um carro uma jovem muito bela.

·         Dias após, em companhia de outro amigo, o Dr. Sá, Paulo participa da festa de N. Senhora da Glória, quando lhe parece a linda moça.

·         Informando-se do amigo, fica sabendo tratar-se de Lúcia, a prostituta mais bela, requintada e disputada da cidade. Mas ele se impressiona com a “expressão cândida do rosto e a graciosa modéstia do gesto”.

·         Um mês após sua chegada, Paulo vai à procura de Lúcia, levado, é claro, pelo desejo de possuir aquela mulher.
·         Após longa e agradável conversa, acaba se surpreendendo com o “casto e ingênuo perfume que respirava a toda a sua pessoa”.
·         A um mínimo lance de seus seios, “ela se enrubesceu como uma menina e fechou o roupão” discretamente.
·         E ele, que fora quente de desejos, agora, na rua, se achava ridículo por não haver ousado mais. Além do que, Dr. Sá lhe confirma que “Lúcia é a mais alegre companheira que pode haver para uma noite, ou mesmo alguns dias de extravagância.”
·         No dia seguinte, Paulo está de volta à casa da heroína. Ao seu primeiro ataque, Lúcia se opõe com duas lágrimas nos olhos.
·         Supondo ser fingimento, mostra-se aborrecido e ela reage atirando-se completamente nua em seus braços, já que era isso que Paulo queria.
·         Mas no auge do prazer do sexo, Paulo percebe algo diferente nas carícias de Lúcia: mesmo no clímax do gozo, parece que ela sofria.
·         Sente, na hora, um imenso dó, ao que ela corresponde cinicamente: “- Que importa? Contanto que tenha gozado de minha mocidade! De que serve a velhice às mulheres como eu ?”
·         Ele quer pagar-lhe, ela rejeita com um meigo aperto de mão.
·         Ele retira-se realmente confuso com “a singularidade daquela cortesã, que ora levava a impudência até o cinismo, ora esquecia-se do seu papel no simples e modesto recato de uma senhora”.
·         As informações que lhe chegam a seu respeito são as piores.
·         Cunha diz que ela é “a mais bonita mulher do Rio e também a mais caprichosa e excêntrica. Ninguém a compreende.
·         “Nunca fica muito tempo com mesmo amante, pois não admite que ninguém adquira direitos sobre ela. Além do mais, é avarenta. Vende tudo o que ganha. Até roupas”.
·         Para Paulo, no entanto ela parece ser o contrário de tudo isso. Afinal, ela finge para ele ou já o ama? Paulo fica em dúvida atroz.
·         Por aqueles dias, numa ceia em casa do Sá, com pessoas (Lúcia, Paulo, Sr. Couto, Laura, Nina, Rochinha, etc...) maldosamente convidadas para transformar a ceia em bacanal, Lúcia desfila toda nua, imitando as poses lascivas dos quadros que estavam nas paredes, ante os olhares voluptuosos dos presentes.
·         Depois, em lágrimas, nos jardins da casa, ela se explica a Paulo.
·         Fez aquilo por desespero, pois ele havia zombado momentos antes: “Se o Senhor não zombasse de mim, não teria feito por coisa alguma deste mundo... E depois por que teria uma decepção total, afinal o que Sá pretendia era mostrar ao seu amigo Paulo quem era Lúcia. -Não foi para isso que se deu essa idéia?! – explicou Lúcia”. E os dois se amaram profundamente, lá mesmo no jardim, á luz da lua, até de madrugada.
·         Decorrido alguns dias, Paulo de certo modo passa a morar com Lúcia, e, apesar das prevenções e restrições, mais e mais se liga a ela por afeto.
·         Lúcia, por sua vez, já ama Paulo e se entrega a ele como um dono e senhor.
·         Há momentos de atritos entre ambos, passageiros, e todos causados pelo egoísmo e incompreensão de Paulo que não entende as profundas transformações que o seu afeto operou nela.
·         A tal ponto, que ela não suportaria mais a idéia de se lhe entregar na cama, pois sente por ele um amor muito puro e profundo.
·         E ele, levado mais por desejo que por afeto, não consegue aceitar esse comportamento sublime.
·         As más línguas já comentam que Paulo, além de viver às custas de Lúcia que “já então procurava viver mais retraída, dispõe-se  a voltar à vida mundana apenas para salvar-lhe a reputação. Mas Paulo – complicado, sádico, estúpido e chato – não compreende”.
·         Lúcia já não vibra como outrora, mesmo quando excitada por Paulo. É a doença que já se faz sentir.
·         Paulo não entende essa frieza e por sua vez se exaspera.
·         Ela sofre calada pois reconhece que “o amor para uma mulher como eu seria a mais terrível punição que Deus poderia infligir-lhe!”.
·         O grande sentimento de Lúcia é cada vez mais sublime e heróico. Já não existe mais nada da antiga cortesã.
·         Paulo, por fim, entende essa nobreza de caráter e compreende o porquê das suas recusas.
·         Ela lhe recusava o corpo porque o amava em espírito. E também porque já está doente.
·         Paulo promete respeitá-la de ora em diante.
·         Lúcia um dia lhe revela todo o seu passado: chamava-se Maria da Glória. Era uma menina feliz de 14 anos e morava com os pais, quando, em 1850, sobreveio a terrível febre amarela. Seus pais, os três irmãos, uma tia caíram de cama, ela ficou só. No auge do desespero, resolveu pedir ajuda a um vizinho rico, Sr. Couto, que em troca de algumas moedas de ouro tirou-lhe a inocência. “o dinheiro ganho com a minha vergonha salvou a vida de meu pai e trouxe-nos um raio de esperança.” Seu pai, porém, sabendo da origem do dinheiro, e supondo ter a filha um amante, a expulsou de casa. Sozinha, sem ter aonde ir, foi acolhida por uma mulher, Jesuína, que, quinze dia depois, à conduziu à prostituição, estipulando  pela beleza de seu corpo um alto preço. O dinheiro, ela o usava para cuidar do que restava da família: “e eu tive o supremo alívio de comprar com a minha desgraça a vida de meus pais e de minha irmã”.
·         Uma colega de infortúnio foi morar com ela. Chamava-se Lúcia. Tornaram-se amigas. Lúcia morreu pouco depois. No atestado de óbito, a heroína fez constar que a falecida se chamava Maria da Glória, adotando para si o nome da amiga morta. “Morri pois para o mundo e para minha família. Meus pais choravam sua filha morta; mas já não se envergonhavam de sua filha prostituída. ”E todo dinheiro que ganhava, destinava-o à preparação de um dote para sua irmã, Ana, a qual passou a manter num colégio interno depois da morte dos pais.
·         Agora Paulo compreende ainda melhor as atitudes misteriosas e contraditórias que Lúcia tomava como cortesã.
·         É que esse gênero de vida lhe parecia sórdido e abjeto. Ela suportava como um martírio, uma autopunição, uma maneira de reparar o seu pecado.
·         Conhecido seu passado heróico, ele passa a sentir por Lúcia uma grande ternura e um amor sincero. Seguem-se dias tranqüilos.
·         Lúcia muda-se para uma casinha modesta e Ana mora com ela. “isto não pode durar muito! É impossível!” É o pressentimento da morte.
·         Lúcia tenta convencer Paulo a se casar com Ana, que já o ama também. Seria uma maneira de perpetuar o amor de ambos, já que ela se julga indigna do puro amor conjugal.
·         Paulo rejeita com veemência em nome do amor que não sente por Ana.
·         Lúcia aborta o filho que esperava de Paulo.
·         Ela se recusa a tomar remédio para expelir o feto morto, dizendo “Sua mãe lhe servirá de túmulo”.
·         Ela já no leito de morte, recebe o juramento de Paulo prometendo-lhe cuidar de Ana como sua filha.

·         Morre docemente nos braços de seu amado.

Análise literária A mão e a luva, Machado de Assis

A MÃO E A LUVA, MACHADO DE ASSIS

SOBRE O AUTOR


Considerado por muitos críticos como o maior escritor brasileiro, Joaquim Maria Machado de Assis teve uma existência relativamente estável e conheceu em vida o prestígio e a fama que lhe cabiam. O mulato nascido no Morro do Livramento, Rio de Janeiro, em 1839, tinha todos os requisitos para ser apenas mais um dos muitos cidadãos fracassados que preenchem o universo das periferias das grandes cidades. Entretanto, ao morrer em 1908, recebe honras fúnebres de chefe de estado. A celebridade alcançada no fim da vida demonstra que a ascensão social alcançada pelo “bruxo do Cosme Velho”, como assim o chamou Carlos Drummond de Andrade, somente foi possível devido ao seu esforço permanente de captar a realidade e mais ainda por seu talento insubstituível de transformar histórias em páginas de livros.
Órfão ainda criança, Machado vendeu doces na rua para ajudar a sustentar a família; na juventude foi caixeiro de uma livraria e tipógrafo, mais tarde tornou-se jornalista, profissão que o encaminhou para a literatura. Porém, o seu sustento vinha do emprego que arranjara no funcionalismo público, chegou a fazer carreira, foi oficial de gabinete de ministro, diretor de órgão público e por ocasião da Proclamação da República em 1889, estava sob seus cuidados a Diretoria do Comércio da cidade do Rio de Janeiro. Além do emprego público, a carreira de Machado de Assis como escritor contou com outra base sólida: O casamento com a portuguesa Carolina de Novais. A esposa tornou-se uma grande incentivadora de seus escritos e há quem diga que em muitos de seus textos há resquícios da influência dela. Conforme opina Coutinho, no decurso de uma atividade literária ininterrupta, iniciada no fim no século XIX, quando seus primeiros versos foram publicados na revista Marmota Fluminense, até a publicação de seu último livro, Memorial de Aires, em 1908, Machado de Assis representou no Brasil o primeiro e o mais acabado modelo de homem autêntico dedicado à arte de escrever.
Não há dúvida quanto à divisão da vasta obra machadiana em dois tempos: Os primeiros textos ainda escritos sob a influência do Romantismo contrastam muito com a parte mais significativa de sua produção literária - a chamada fase da maturidade - esta iniciada em 1881 com a publicação de Memórias Póstumas de Brás Cubas e consolidada mais tarde em obras primas como Quincas Borba e Dom Casmurro, demonstra que Machado tornou-se hábil em desenvolver uma prosa realista, permeada de complexos retratos psicológicos que se distanciavam muito da idealização romântica e também dos exageros cientificistas dos demais autores do Realismo-Naturalismo

VISÃO GERAL
A obra “A Mão e a Luva” foi publicada no Rio de Janeiro por E. Gomes de Oliveira, em 1874. Foi o segundo romance escrito por Machado de Assis. Na época do lançamento, a obra não teve uma boa receptividade por parte da crítica, apesar de elogiar o estilo. Desse modo, o livro foi esquecido, até ser reeditado 33 anos depois. Foi traduzida para o Inglês com o título: The hand and the glove” e publicada pela The University Press of Kentucky, em 1970. Rendeu ainda, uma adaptação para o teatro, no ano de 2004, sob a direção de Adriana Tolentino.
A Mão e a Luva, segundo romance de Machado de Assis, difere-se dos outros livros da fase dita ‘romântica’ do autor. Narra a história de Guiomar, moça de origem humilde que ascende socialmente por ser afilhada de uma baronesa. O drama da heroína está na escolha de um marido entre seus três pretendentes: o romântico Estevão, o frio Luís Alves e o preguiçoso Jorge.
O trunfo do livro é a abertura estética do romance brasileiro ao Realismo.
A trama narrativa em A mão e a luva nasce para destacar as relações familiares, precisamente, em torno da figura de um feminino. O universo da trama desse romance é relativamente simples: ela se resume na tensão de uma mulher pretendida por três homens. Nessa disputa, ganham relevância as figuras de Estevão e Luís Alves, dois amigos íntimos, dos tempos de faculdade, que terão o ciclo de amizade interrompido pelo amor de Guiomar. Narrativa simples, mas engenhosa, sobretudo nas tramas duplas, que seguem paralelas, em torno dessas das representações de personagens masculinas: Estevão, Luís Alves e Jorge.

NARRADOR
O foco narrativo em “A Mão e a Luva” está na 3ª pessoa do singular. É evidente no início da história: “Estevão meteu as mãos nos cabelos com um gesto de angústia”. Ainda em tempo, deve-se observar que o narrador interage com o leitor, tomando a variante de “narrador intruso”, como na passagem do capítulo IV: “Enquanto as três almoçam, relancemos os olhos ao passado (…)”.
Irônico, debochado, o narrador de A Mão e a Luva se apropria da dramaturgia, regendo a narrativa como lhe convém. Constantemente lembrando o leitor tradicionalmente romântico de que ambos estão imersos em um mundo ficcional, mas verossímil – “[…] é privilégio do romancista e do leitor ver no rosto de uma personagem aquilo que as outras não veem ou não podem ver.” (ASSIS, 2005, p.79) -; de que ele não será um idealizador, e procurará representar fielmente a realidade — “Era melhor, — mais romântico pelo menos, que eu o pusesse a caminho da academia, com o desespero no coração, lavado em lágrimas, ou a bebê-las em silêncio, como lhe pedia a sua dignidade de homem. Mas que lhe hei de eu fazer? Ele foi daqui com os olhos enxutos, distraindo-se dos tédios da viagem com alguma pilhéria de rapaz, — rapaz outra vez, como dantes.” (ASSIS, 2005, p.18) — e que o seu trabalho maior é desvendar os segredos anímicos de seus personagens, sobretudo ressaltando que é ele quem escolhe as descrições dos perfis: “Eu não a quero dar como uma alma que a paixão desatina a cega, nem fazê-la morrer de um amor silencioso e tímido. Nada disso era, nem faria.” (ASSIS, 2005, p.93).
A ironia mais mordaz do narrador é em relação aos estereótipos românticos, materializados nas figuras dos pretendentes de Guiomar: o ardor exacerbado de Estevão, que é constantemente ridicularizado; o egoísta e frio Luís Alves; e o burguês preguiçoso e mimado Jorge, brilhantemente sintetizado na passagem: “possuir era seu único ofício.” (ASSIS, 2005, p.87).
Desta forma, podemos caracterizar, não só o livro abordado, como também toda a primeira fase machadiana, como “pré-realista”. Portanto, A Mão e a Luva e sua fase correspondente vieram para preparar o território para o Realismo pesado e crítico que Machado viria a nos apresentar com a publicação de Memórias Póstumas de Brás Cubas, obra na qual é nítido que a estética realista triunfou.

ENREDO
Exposição: no capítulo I, são apresentados os primeiros personagens, Estevão e Luís Alves. Eles são amigos e estudam na mesma instituição educacional – a chamada academia de São Paulo (apesar da maior parte da história se passar no Rio de Janeiro). A história começa já com um conflito secundário, provocado pela dor de Estevão ao ser esnobado pela moça que amava. Tal rejeição o faz pensar em suicidar-se. Estevão procura, então, a seu amigo e confidente, Luís Alves para desabafar. Finalmente, este aconselha aquele que se esquecesse de tais coisas (o suicídio e a decepção amorosa), e acrescenta: “O amor é uma carta (…); carta de parabéns quando se lê, carta de pêsames quando se acabou de ler. Tu que chegaste ao fim, põe a epístola no fundo da gaveta, e não te lembres de ir ver se ela tem um post-scriptum…”
                                        
Complicação: a complicação da história acontece quando Estevão, depois de concluir seus estudos em São Paulo, volta para o Rio de Janeiro. Até aqui, tudo bem, não fosse por ele encontrar uma moça, vizinha de Luís Alves, no jardim da chácara deste. Para a surpresa dele, a moça era Guiomar, aquela a quem ele amara e de quem se desiludira. O reencontro torna-se uma complicação quando Estêvão recai de amores pela mesma moça. Esqueceu-se de seguir o conselho metafórico de seu amigo Luís Alves há dois anos, quando disse que ele não voltasse a ver se a carta tinha um post-scriptum. Essa recaída é o gatilho que leva a outros fatos que culminarão no clímax do romance.

Clímax: o autor constrói um clima de tensão no trecho dos capítulos VIII ao XVII, os quais cercam os acontecimentos que antecedem ao desfecho. Essa tensão em “A Mão e a Luva” está nos fatos que encerram um período de decisões em relação ao destino matrimonial de Guiomar, que depois de desiludir a Estevão, (outra vez) e ser pretendida de Jorge, sobrinho da baronesa. Há uma correria no desenrolar dos fatos, pois, a personagem principal deseja realizar seu desejo ambicioso: galgar posição social ao casar com Luís Alves, recém eleito deputado. A tensão é tanta que a moça escreve um bilhete com a mensagem: “Peça-me” e o joga pela janela do doutor Luís Alves.

Desfecho: a decisão de Guiomar em dar um sinal a Luís Alves para que este a pedisse em casamento é o acontecimento que desencadeia o desfecho: o casamento entre duas pessoas, ambiciosas, de uma sagacidade encontrada em poucos, que se combinavam como “a mão e a luva”.

PERSONAGENS
Estevão: Machado apresenta-o como um dos protagonistas, que também é anti-herói; é vítima de suas sentimentalidades exageradas; vive um conflito psicológico, pois, mergulha em uma crise emocional por não ter o amor de Guiomar. É uma clara alusão aos exageros ultrarromânticos.
Luís Alves: o narrador parece, às vezes, tentar despertar emoção/simpatia (no leitor) em favor desse rapaz, pois permite que ele tenha mais espaço que Estevão ou Jorge. É descrito com ambicioso, mas como não sendo uma má pessoa. Sabia reger os sentimentos, era seguro de si. Ele representa o herói da história, pois tem qualidades maiores que seus pares na obra.
Guiomar: a protagonista, e heroína da história, é pobre e de origem simples, perde seu pai, e logo depois, a mãe, ficando aos cuidados de uma baronesa, que a adota e a toma por filha por ocasião da morte de Henriqueta, sua filha de sangue. Desconstrói o romantismo e a fragilidade das mocinhas dos romance românticos. Guiomar é forte, decidida, racional e casa-se não pelo envolvimento sentimental puramente, mas por perceber que suas ambições sociais encontravam mais harmonia em Luís Alves.
Mrs. Oswald: britânica, e governanta da casa da baronesa, o braço direito desta. Personagem tipicamente inglesa, em seus modos e educação, mas brasileira por dedicação à sua patroa, a baronesa. É uma antagonista na história, pois, por querer realizar os desejos de sua patroa, atrapalha um pouco as pretensões e aspirações amorosas de Guiomar.
A baronesa: viúva, generosa, conhece a Guiomar desde que esta era uma criança e ajuda-a em sua formação. Teme pela não realização completa de seus desejos quanto ao futuro de Guiomar. Com Mrs. Oswald, tenta cuidar em arrumar um bom pretendente para a afilhada, já que a sombra do jovem doutor Estevão, moço de origem pobre, ameaça os seus projetos para Guiomar.
Jorge: Machado de Assis introduz um personagem insulso, indiferente ao que está ao seu redor. Preferido por sua tia, a baronesa, a ser o marido de Guiomar. Ele até que gosta dela, segundo ele, mas, é um gostar “tanto faz”. Trama com Luís Alves impedir, ou melhor, convencer a baronesa a não fazer uma viagem, que atrapalharia os planos dele e de Jorge.

TEMPO
 O tempo em “A Mão e a Luva” é cronológico, pois os fatos seguem uma sequência natural, onde observamos a passagem dos dias, meses e anos. Isso fica evidente no trecho: “Um mês depois de Estevão chegar a São Paulo (…)”. É importante lembrar que tempo cronológico relaciona-se com o enredo linear.
O tempo no qual se passa a história é situado no século XIX, mais precisamente em 1853 (vinte e um anos antes da publicação do romance, em forma de folhetim no jornal O Globo, em 1874).

AMBIENTE
Nessa época, o Brasil vivia os seus anos de Império, e o Rio de Janeiro, o principal espaço que ambienta o romance, era a capital do país.
Machado descreve pouco o ambiente. Mas constrói a tensão do romance com os acontecimentos que deixam o leitor, ou leitora, em suspense, pois a história toma rumos inesperados, talvez influenciados pelas incertezas que são dominantes nestas terras abaixo do Equador. Por exemplo, Luís Alves, que inicialmente parece nem notar a existência de Guiomar, apesar de tê-la cortejado anteriormente, passa a querer a moça.
Machado transmite emoção ao descrever poeticamente a natureza, e principalmente a protagonista Guiomar. Ainda, transmite a ideia de um ambiente burguês, relatando características da alta sociedade dos dias do Brasil Império.

INTERTEXTUALIDADE: ESTEVÃO E A CRÍTICA AO EXCESSO SENTIMENTAL

A construção do clima romântico na narrativa se dá, principalmente, por duas forças maiores: a influência do Romantismo estrangeiro e as referências ao movimento análogo no Brasil. Logo no início do livro, enquanto a personalidade das personagens ainda está se esboçando, o narrador cita um traço fundamental para a formação de Estevão: “O rapaz acertara de abrir uma página de Werther; leu meia dúzia de linhas, e o acesso voltou mais forte do que nunca.” (ASSIS, 2005, p.17). O acesso em questão era o desespero causado pela rejeição primeira de Guiomar, que o colocou na posição de amante abandonado. Já a referência feita é ao romance Os Sofrimentos do Jovem Werther, do alemão Goethe, que se tornou molde para a estética ultrarromântica. O livro termina com o suicídio do protagonista, depois de uma vida amarga e depressiva, calcada na ausência da mulher amada. Werther e Estevão são muito similares, já que apresentam personalidades depressivas e exageradas: “Apenas direi por alto que ele pensou três vezes em morrer, duas em fugir à cidade, quatro em ir afogar a sua dor mortal naquele ainda mais mortal pântano de corrupção em que apodrece e morre tantas vezes a flor da mocidade. Em tudo isto era o seu espírito apenas um joguete de sensações contínuas e variadas. A força, a permanência do afeto não lhe bastava a dar seguimento e realidade às concepções vagas de seu cérebro – enfermo, ainda quando estava de saúde.” (ASSIS, 2005, p.72).
Estevão é quase um Werther brasileiro, não fosse o seu desfecho. E até nesse ponto o narrador ironiza o seu destino no final de A Mão e a Luva: “A frouxidão do ânimo negou-lhe essa última ambição. Os olhos podiam fitar a morte, como podiam encarar a fortuna; mas faltavam-lhe os meios de caminhar a ela.” (ASSIS, 2005, p.115). Ao concluir que o rapaz não teve sequer coragem de pôr fim à própria vida, o narrador deixa claro que a personalidade romântica é meramente discursiva e frouxa, ou seja, não está preparada para enfrentar ou questionar a realidade.
Seguido do romantismo alemão, o narrador convida também o inglês: “As mesmas quimeras tinha, e a mesma simpleza de coração; só não as mostrara nos versos que imprimiu em jornais acadêmicos, os quais eram todos repassados do mais puro byronismo, moda muito do tempo. ” (ASSIS, 2005, p.21, grifo meu). Lord Byron, representante fiel do ultrarromantismo, é aqui citado para trazer consigo a ideia do spleen, do escape do sofrimento na boemia, e dos exageros românticos. Há ainda um inglês importante, mas que será matéria de outro tópico.
Após proporcionar esses diálogos com os estrangeiros, o narrador também estabelece uma ligação com os românticos nacionais. Estevão é claramente um representante da 2ª geração — o mal do século — caracterizada pelo desejo da concretização do amor inalcançável, pela nostalgia da infância e o escape pela morte: “A ideia do suicídio fincou-lhe mais adentro no espírito […]. Não tenho outro recurso, pensou ele; é necessário que morra. É uma dor só, é a liberdade. Ao voltar para casa, uma criança que brincava na rua […] fê-lo […] invejoso daquela boa fortuna da infância […]. Mas a inveja da morte e a inveja da inocência foram ainda substituídas pela inveja da felicidade.” (ASSIS, 2005, p.72).
A desconstrução do Romantismo começa, entretanto, quando a personagem que materializa essa escola estética é constantemente criticada e satirizada. Estevão representa claramente os ideais ultrarromânticos, byronianos, com um estilo semelhante a Álvares de Azevedo na primeira parte da sua Lira dos Vinte Anos. Ao contrastá-lo constantemente com Luís Alves, homem frio e calculista, o narrador exalta a personalidade desse último em detrimento da do nosso romântico. Ao fim do livro, é clara a superação das tragédias românticas: a heroína, Guiomar, escolhe Luís Alves, que casava perfeitamente com a sua ambição: “Ajustavam-se ambas, como se aquela luva tivesse sido feita para aquela mão.” (ASSIS, 2005, p.116).
No entanto, o grande trunfo do romance machadiano foi a inserção do drama na narrativa romanesca. Além das inúmeras referências a peças de teatro, a própria estrutura do romance foi modificada, mesclando elementos dramáticos com a prosa. Sobre este tópico, utilizarei o estudo de Ronaldes de Melo e Souza, O Romance Tragicômico de Machado de Assis.
Como aludido anteriormente, eis aqui o inglês que faltava: William Shakespeare. Porém, em A Mão e a Luva, é menos lírico e mais dramático. Mrs. Oswald nos apresenta a ele: “Bem está o que bem acaba, disse um poeta nosso, homem de juízo.” (ASSIS, 2005, p.34), numa referência a uma das comédias shakespearianas. Assim como o futuro Bento Santiago, de Dom Casmurro, Estevão assiste a uma apresentação de Otelo e a aplaude fervorosamente. Mais à frente na história, o nosso romântico se depara com uma indagação fatal, que também dialoga com os gêneros teatrais: “Estevão retirou-se dali cabisbaixo e triste, batido de contrários sentimentos, cheio de uma tristeza e de uma alegria que mal se combinavam, e por cima de tudo isso o eco vago e surdo desta interrogação:  — Entro num drama ou saio de uma comédia? ” (ASSIS, 2005, p.31).
Em seu A Mão e a Luva, Machado inaugura uma nova maneira do fazer literário, focando principalmente no drama de caracteres. Logo na primeira advertência ao leitor, ele já deixa claro que o objetivo principal da narrativa será “[…] o desenho de tais caracteres […] servindo-me a ação apenas de tela em que lancei os contornos dos perfis.” (ASSIS, 2005, p.12). Dessa forma, opõe o livro ao romance de costumes e ao romance psicológico romântico e realista.




Powered By Blogger

Flickr