ANÁLISE LITERÁRIA “LUCÍOLA”,
José de Alencar
José de Alencar é um dos
nossos mais célebres e férteis romancistas. Dentre a obra
desse memorável autor,
"Lucíola", juntamente com “Senhora”, é um de seus mais famosos
romances urbanos. Alencar se dedicou também ao chamado romance
indianista, tais como "O
Gurarani" e "Iracema"; aos romances
regionalistas, como "O Gaúcho" e "O Sertanejo", e
históricos, "As Minas de Prata" e "A Guerra dos Mascates".
Enquanto romance urbano,
anterior ao aparecimento do Realismo em nossa literatura, ele é
fundamentalmente uma crônica de costumes, um retrato da Corte ou da sociedade fluminense na segunda metade do século XIX. Ou seja
o texto focaliza a época em que o próprio escritor viveu. Nesse sentido, é
muito apropriado o comentário do crítico Alfredo Bosi sobre os romances urbanos
de José
de Alencar:
"Alencar, cioso da
própria liberdade, navega feliz nas águas do remoto e do longínquo. É sempre
com menoscabo ou surda irritação que olha o presente, o progresso, "a vida
em sociedade"; e quando se detém no juízo da civilização, é para deplorar
a pouquidade das relações cortesãs, sujeitas ao Moloc do dinheiro. Daí o
mordente de suas melhores páginas dedicadas aos costumes burgueses em 'Senhora'
e 'Lucíola'".
Em outras palavras, Alencar
critica a sociedade que lhe é contemporânea, não a partir da perspectiva de uma
transformação futura, mas na da nostalgia de um passado que só na ficção pode
reviver plenamente. De qualquer modo, é em "Senhora" e
"Lucíola" que atinge o ponto alto em termos de crítica social e
procura se aprofundar na psicologia das personagens femininas, traçando o que
se convencionou chamar de seus "perfis de mulher".
CARACTERÍSTICAS DA
ESCRITA DE JOSÉ DE ALENCAR
·
Lirismo – não no sentido literário, mas no
sentido de visão da realidade. Nesse aspecto, Alencar é um escritor
eminentemente lírico, pois é delicado, terno, de sensibilidade fina, imaginação
fértil, estilo cheio de graça e harmonia. A realidade, principalmente a
natureza, sempre que possível, é embelezada poeticamente na sua pena. A maioria
dos críticos concorda que ele criou seu estilo, expresso numa musicalidade toda
sua.
·
Gosto pela descrição – a descrição parece ser o forte de
Alencar, principalmente dessas três realidades: paisagem, personagem e
vestuário feminino. A descrição da paisagem sobressai em qualidade e quantidade
nos seus romances regionalistas e indianistas. Mesmo nos urbanos, sempre haverá
um parêntese reservado para a paisagem (natureza) ou cenário (salões,
ambientes).
·
Comparações – as comparações de Alencar,
geralmente, referem-se aos personagens, ora em seus detalhes físicos, ora em
seus estados de alma, ora em seus atributos morais.
·
Desarmonias – é mais ou menos aquilo que atrás se
chamou de ilogismo. Lá, tal ilogismo foi mostrado como uma das características
românticas no livro, Aqui, as “desarmonias” aparecem como uma das características
do estilo alencariano, “é o choque entre o mal e o bem”, diz Antônio Cândido.
LUCÍOLA
Lucíola
é o quinto romance
de Alencar e o primeiro que ele denominou de “perfis de mulher”( Lucíola, Diva
e Senhora ). Situa-se entre seus romances urbanos, que representam um
levantamento da nossa vida burguesa do século passado mais considerável do que
o levado a efeito por Machado de Assis, na opinião de Heron de Alencar. Fixam o
Rio de Janeiro da época, com a sua fisionomia burguesa e tradicional, com uma sociedade
endinheirada que frequentava o Teatro Lírico, passeava à tarde na Rua do
Ouvidor e à noite no Passeio Público, morava no Flamengo, em Botafogo ou Santa
Teresa e era protagonista de dramas de amor que iam do simples namoro à paixão
desvairada.
O romance Lucíola é lançado em 1862 e causou viva polêmica porque trazia como
protagonista uma cortesã de nome Lúcia. Mais do que isso: falava da
reabilitação dessa cortesã pelo amor. Hoje esse enredo talvez não provocaria
reações tão exacerbadas do público. Mas naquela época tal temática representou
um escândalo porque para os rígidos padrões de conduta social e moral da época
isso era tido como inaceitável. A obra foi rotulada de imoral. Mas a polêmica
não pára apenas na acusação de imoralidade, porque para muitos a obra não
passava de mera imitação de A Dama das Camélia de Alexandre Dumas Filho. Dessa
forma, a cortesã Lucia não passava de uma imitação do comportamento da cortesã
Margarida, protagonista de A Dama das
Camélias.
CARACTERÍSTICAS
ROMÂNTICAS DA OBRA
·
Subjetivismo – o mundo do romântico gira em torno de
seu “eu”: do que ele sente, do que ele pensa, do que ele quer. Por isso o poeta
e o personagem na ficção romântica estão em contínua desarmonia com os valores
e imposições da sociedade e\ou da família. Em Lucíola encontram-se pelo menos
duas grandes manifestações desse subjetivismo romântico. A primeira está na própria estrutura narrativa do romance, onde
temos um narrador de primeira pessoa, em que a história é narrada do ponto de
vista de uma única pessoa. A Segunda
está na oposição indivíduo X sociedade. Para Edgard Cavalheiro “o divórcio
entre o homem e o meio é a pedra de toque de um autêntico espírito romântico.
Sobrepor sentimento à razão, o entusiasmo ao raciocínio, o subjetivismo ao
objetivismo, são diretrizes que marcaram a escola”. No romance , Paulo e Lúcia
ora se insurgem contra as convenções sociais, ora satisfazem essas mesmas
convenções, embora sempre reafirmando o próprio “eu”e fazendo sua
personalidade.
·
Exaltação do amor – o amor é a mola mestra da ficção
romântica em prosa e verso. Mas o amor sublime, alheio às convenções sociais,
feito de sacrifício e, às vezes, de heroísmos. Em Lucíola, a temática central
está exatamente nesta exaltação do amor como força purificadora, capaz de transformar
uma prostituta numa amante sincera e fiel. E o romance termina com uma patética
declaração de amor, balbuciada por uma prostituta regenerada por esse mesmo
amor, momentos antes de sua morte.
·
Amor e Morte – em defesa do direito de amar e ser
amado, os heróis e heroínas românticos são capazes de sacrifícios e renúncias
incríveis. Diante da impossibilidade da concretização desse amor mais forte, a
atitude entre os românticos é o desejo de morte: morte natural ou suicídio.
·
Sentimentalismo melancólico – o romântico é acima de tudo um
sentimental. Os heróis são choramingas, e colocam o sentimento acima da razão,
elegendo o coração como norma suprema de conduta pessoal e social. O
comportamento das personagens é imprevisível, dependendo de seus estados de alma.
Em Lucíola, por exemplo, um mínimo contratempo é suficiente para lançar Paulo e
Lúcia na mais profunda tristeza.
·
Ilogismo – para Domício Proença, tal ilogismo na
literatura romântica “leva, inclusive, a uma instabilidade emocional traduzida
em atitudes antitéticas ou paradoxais: alegria e tristeza, entusiasmo e
depressão.” O comportamento de Lúcia ora excêntrico ora virtuoso; e o
comportamento de Paulo, generoso e mesquinho, compreensivo e pilantra : tudo
isso dá à intriga do romance um atrativo todo especial que, por sua vez, ora
atrai ora aborrece o leitor.
·
Outras características – imaginação e fantasia, culto da
natureza, senso de mistério, exagero.
NARRADOR
·
Romance
de primeira pessoa, ou seja, quem narra a história não é Alencar diretamente.
Ele o faz por meio de um narrador-personagem que viveu os episódios, no caso,
Paulo. Paulo, através de cartas dirigidas a uma senhora (por quem o autor se
faz passar) conta uma história de amor acontecida há seis anos entre ele e
Lúcia. Na estrutura narrativa de Lucíola, portanto, pode-se observar o
seguinte:
·
Há
um autor real, José de Alencar;
·
Um
autor fictício, a senhora G.M., destinatárias das cartas de Paulo;
·
Um
narrador, Paulo, com a incumbência e o privilégio de ordenar os fatos,
comentá-los e tirar-lhes conclusões. À medida que transmite os fatos, vai
fornecendo ao leitor elementos para a análise de Lúcia e dele mesmo.
Ø
No
romance, os fatos são apresentados sob dois ângulos diferentes:
·
O
de Paulo-personagem, que transmite ao leitor as sensações vividas com Lúcia;
·
O
de Paulo- narrador que, por vezes, interrompe a narrativa fazendo reflexões ou
dirigindo-se à destinatária de suas cartas.
TEMPO
·
A
história se passa no século passado: 1855.
·
Numa
leitura atenta, o leitor percebe o Rio de Janeiro da época de D.Pedro II, com
seus salões, burguesia, seu vestuário, etc.
·
Tempo
narrativo, ele é eminentemente “cronológico”, ou seja, em Lucíola os
acontecimentos se sucedem numa ordem quase normal, com uma seqüência natural de
horas, dias, meses e anos. Só há um momento em que o fluxo narrativo retroage:
quando Lúcia narra a Paulo o seu passado.
ESPAÇO
·
Rio
de Janeiro: há referências de seus bairros(Santa Tereza), ruas(das Mangueiras),
população, festas(a da Glória), teatros, lojas, etc.
·
É
curiosa a relação entre os locais e o comportamento amoroso-sexual de Paulo e
Lúcia, agindo aqueles no sentido de aproximação ou afastamento, de maior ou
menor realização do casal.
PERSONAGENS
·
Lúcia – sua principal característica é a
contradição. Como cortesã era a mais depravada. Basta que se lembre da orgia
romana em casa de Sá. No entanto a prostituição era-lhe um tormento constante,
já que não se entregava totalmente a ela. E os atos libidinosos constituíam
para ela verdadeira autopunição aliada ao angustiante sentimento de culpa. Coexistem
nela duas pessoas: Maria da Glória, a menina inocente e simples, e Lúcia, a
cortesã sedutora e caprichosa.
Lúcia
|
Maria da Glória
|
Mulher
|
Menina
|
Depravação, luxúria
|
Pureza, ingenuidade
|
Sentimento de culpa
|
Dignidade
|
Prostituição
|
Inocência
|
Caprichosa, excêntrica
|
Simples, meiga
|
Rejeita o amor
|
Tende pra o amor
|
demônio
|
Anjo
|
·
Paulo – provinciano de Pernambuco, 25 anos,
veio ao Rio de Janeiro tentar se
estabelecer. O romance não esclarece se ele é formado ou não. Espírito
observador e sensível, foi o único a compreender o estranho caráter de Lúcia,
embora ficasse na dúvida sobre sua real personalidade. É um ingênuo personagem
romântico. Apesar de se declarar pobre, vive byronicamente, de sonhos e de
amor.
·
Dr. Sá e Cunha – amigos de Paulo, sendo aquele desde a
infância. Encarnam a moral burguesa e suas máscaras: austera com os outros,
benigna consigo. Não possuem personalidade bem delineada no livro. Ambos vêem
em Lúcia apenas a prostituta.
·
Couto e Rochinha – O primeiro é um velho dado a jovem
galante. Encarna a obsessão sexual e a velhice. Representa a sociedade que
explora e corrompe. Foi ele quem aproveitou a necessidade e a inocência de
Lúcia. O segundo é um jovem de 17 anos, tez amarrotada, profundas olheiras,
velho prematuro. Libertino precoce.
·
Laura e Nina – são meretrizes, mas sem duplicidade
de caráter. Não são capazes de “descer tão baixo”, porém não possuem a “nobreza
e altivez” da protagonista.
·
Jesuína e Jacinto –aquela, é uma mulher de 50 anos, seca
e já encarquilhada. Foi quem recolheu Lúcia quando seu pai a expulsou de casa e
a iniciou na prostituição. Este, é um homem de 45 anos, e “vive da prostituição
de moças pobres e da devassidão de homens ricos”. Por seu intermédio, Lúcia
vendia as jóias ricas que ganhava e enviava dinheiro à família pobre. É quem
mantém a ligação misteriosa no livro, entre Lúcia e Ana. Enfim, é quem cuida
dos negócios dela.
·
Ana – é a irmã de Lúcia, que a fez educar
num colégio até os doze anos como se fosse sua filha. Lúcia tenta casá-la com
Paulo para ser uma espécie deperpetuação e concretização de seu amor por ele.
ENREDO
·
Chegada
de Paulo Silva ao Rio de Janeiro, em 1855, com a intenção de aí se estabelecer.
·
No dia de sua chegada à corte, após o jantar,
sai em companhia de um amigo para conhecer a cidade.
·
Na
rua das Mangueiras vê passar em um carro uma jovem muito bela.
·
Dias
após, em companhia de outro amigo, o Dr. Sá, Paulo participa da festa de N.
Senhora da Glória, quando lhe parece a linda moça.
·
Informando-se
do amigo, fica sabendo tratar-se de Lúcia, a prostituta mais bela, requintada e
disputada da cidade. Mas ele se impressiona com a “expressão cândida do rosto e
a graciosa modéstia do gesto”.
·
Um
mês após sua chegada, Paulo vai à procura de Lúcia, levado, é claro, pelo
desejo de possuir aquela mulher.
·
Após
longa e agradável conversa, acaba se surpreendendo com o “casto e ingênuo
perfume que respirava a toda a sua pessoa”.
·
A
um mínimo lance de seus seios, “ela se enrubesceu como uma menina e fechou o
roupão” discretamente.
·
E
ele, que fora quente de desejos, agora, na rua, se achava ridículo por não
haver ousado mais. Além do que, Dr. Sá lhe confirma que “Lúcia é a mais alegre
companheira que pode haver para uma noite, ou mesmo alguns dias de
extravagância.”
·
No
dia seguinte, Paulo está de volta à casa da heroína. Ao seu primeiro ataque,
Lúcia se opõe com duas lágrimas nos olhos.
·
Supondo
ser fingimento, mostra-se aborrecido e ela reage atirando-se completamente nua
em seus braços, já que era isso que Paulo queria.
·
Mas
no auge do prazer do sexo, Paulo percebe algo diferente nas carícias de Lúcia:
mesmo no clímax do gozo, parece que ela sofria.
·
Sente,
na hora, um imenso dó, ao que ela corresponde cinicamente: “- Que importa?
Contanto que tenha gozado de minha mocidade! De que serve a velhice às mulheres
como eu ?”
·
Ele
quer pagar-lhe, ela rejeita com um meigo aperto de mão.
·
Ele
retira-se realmente confuso com “a singularidade daquela cortesã, que ora
levava a impudência até o cinismo, ora esquecia-se do seu papel no simples e
modesto recato de uma senhora”.
·
As
informações que lhe chegam a seu respeito são as piores.
·
Cunha
diz que ela é “a mais bonita mulher do Rio e também a mais caprichosa e
excêntrica. Ninguém a compreende.
·
“Nunca
fica muito tempo com mesmo amante, pois não admite que ninguém adquira direitos
sobre ela. Além do mais, é avarenta. Vende tudo o que ganha. Até roupas”.
·
Para
Paulo, no entanto ela parece ser o contrário de tudo isso. Afinal, ela finge
para ele ou já o ama? Paulo fica em dúvida atroz.
·
Por
aqueles dias, numa ceia em casa do Sá, com pessoas (Lúcia, Paulo, Sr. Couto,
Laura, Nina, Rochinha, etc...) maldosamente convidadas para transformar a ceia
em bacanal, Lúcia desfila toda nua, imitando as poses lascivas dos quadros que
estavam nas paredes, ante os olhares voluptuosos dos presentes.
·
Depois,
em lágrimas, nos jardins da casa, ela se explica a Paulo.
·
Fez
aquilo por desespero, pois ele havia zombado momentos antes: “Se o Senhor não
zombasse de mim, não teria feito por coisa alguma deste mundo... E depois por
que teria uma decepção total, afinal o que Sá pretendia era mostrar ao seu
amigo Paulo quem era Lúcia. -Não foi para isso que se deu essa idéia?! –
explicou Lúcia”. E os dois se amaram profundamente, lá mesmo no jardim, á luz
da lua, até de madrugada.
·
Decorrido
alguns dias, Paulo de certo modo passa a morar com Lúcia, e, apesar das
prevenções e restrições, mais e mais se liga a ela por afeto.
·
Lúcia,
por sua vez, já ama Paulo e se entrega a ele como um dono e senhor.
·
Há
momentos de atritos entre ambos, passageiros, e todos causados pelo egoísmo e
incompreensão de Paulo que não entende as profundas transformações que o seu
afeto operou nela.
·
A
tal ponto, que ela não suportaria mais a idéia de se lhe entregar na cama, pois
sente por ele um amor muito puro e profundo.
·
E
ele, levado mais por desejo que por afeto, não consegue aceitar esse
comportamento sublime.
·
As
más línguas já comentam que Paulo, além de viver às custas de Lúcia que “já
então procurava viver mais retraída, dispõe-se
a voltar à vida mundana apenas para salvar-lhe a reputação. Mas Paulo –
complicado, sádico, estúpido e chato – não compreende”.
·
Lúcia
já não vibra como outrora, mesmo quando excitada por Paulo. É a doença que já
se faz sentir.
·
Paulo
não entende essa frieza e por sua vez se exaspera.
·
Ela
sofre calada pois reconhece que “o amor para uma mulher como eu seria a mais
terrível punição que Deus poderia infligir-lhe!”.
·
O
grande sentimento de Lúcia é cada vez mais sublime e heróico. Já não existe
mais nada da antiga cortesã.
·
Paulo,
por fim, entende essa nobreza de caráter e compreende o porquê das suas
recusas.
·
Ela
lhe recusava o corpo porque o amava em espírito. E também porque já está
doente.
·
Paulo
promete respeitá-la de ora em diante.
·
Lúcia
um dia lhe revela todo o seu passado: chamava-se Maria da Glória. Era uma
menina feliz de 14 anos e morava com os pais, quando, em 1850, sobreveio a
terrível febre amarela. Seus pais, os três irmãos, uma tia caíram de cama, ela
ficou só. No auge do desespero, resolveu pedir ajuda a um vizinho rico, Sr.
Couto, que em troca de algumas moedas de ouro tirou-lhe a inocência. “o
dinheiro ganho com a minha vergonha salvou a vida de meu pai e trouxe-nos um
raio de esperança.” Seu pai, porém, sabendo da origem do dinheiro, e supondo
ter a filha um amante, a expulsou de casa. Sozinha, sem ter aonde ir, foi
acolhida por uma mulher, Jesuína, que, quinze dia depois, à conduziu à
prostituição, estipulando pela beleza de
seu corpo um alto preço. O dinheiro, ela o usava para cuidar do que restava da
família: “e eu tive o supremo alívio de comprar com a minha desgraça a vida de
meus pais e de minha irmã”.
·
Uma
colega de infortúnio foi morar com ela. Chamava-se Lúcia. Tornaram-se amigas.
Lúcia morreu pouco depois. No atestado de óbito, a heroína fez constar que a
falecida se chamava Maria da Glória, adotando para si o nome da amiga morta.
“Morri pois para o mundo e para minha família. Meus pais choravam sua filha
morta; mas já não se envergonhavam de sua filha prostituída. ”E todo dinheiro
que ganhava, destinava-o à preparação de um dote para sua irmã, Ana, a qual
passou a manter num colégio interno depois da morte dos pais.
·
Agora
Paulo compreende ainda melhor as atitudes misteriosas e contraditórias que
Lúcia tomava como cortesã.
·
É
que esse gênero de vida lhe parecia sórdido e abjeto. Ela suportava como um
martírio, uma autopunição, uma maneira de reparar o seu pecado.
·
Conhecido
seu passado heróico, ele passa a sentir por Lúcia uma grande ternura e um amor
sincero. Seguem-se dias tranqüilos.
·
Lúcia
muda-se para uma casinha modesta e Ana mora com ela. “isto não pode durar
muito! É impossível!” É o pressentimento da morte.
·
Lúcia
tenta convencer Paulo a se casar com Ana, que já o ama também. Seria uma
maneira de perpetuar o amor de ambos, já que ela se julga indigna do puro amor
conjugal.
·
Paulo
rejeita com veemência em nome do amor que não sente por Ana.
·
Lúcia
aborta o filho que esperava de Paulo.
·
Ela
se recusa a tomar remédio para expelir o feto morto, dizendo “Sua mãe lhe
servirá de túmulo”.
·
Ela
já no leito de morte, recebe o juramento de Paulo prometendo-lhe cuidar de Ana
como sua filha.
·
Morre
docemente nos braços de seu amado.