22 de jan. de 2010

Por que ler?



Numa entrevista dada à revista Veja, o crítico literário norte americano Harold Bloom, autor do livro Como e por que ler, respondeu assim a essa pergunta:

A informação está cada vez mais ao nosso alcance. Mas a sabedoria, que é o tipo mais precioso de conhecimento, essa só pode ser encontrada nos grandes autores da literatura. Esse é o primeiro motivo por que devemos ler. O segundo motivo é que todo bom pensamento, como já diziam os filósofos e psicólogos, depende memória. Não é possível pensar sem lembrar - e são os livros que ainda preservam a maior parte de nossa herança cultural. Finalmente, este motivo está relacionado ao anterior, eu diria que uma democracia depende de pessoas capazes de pensar por si próprias. E ninguém faz isso sem ler.

Revista Veja, nº 1685 

20 de jan. de 2010

Conselhos durante um terremoto

Não é só no Haiti que ocorre terremotos.
Os tremores, as "incômodas acomodações" estão aí todos os dias lutando para nos desestruturar e nos fazer perder o eixo das coisas, da paisagem, da própria vida.
Mas assim como no Haiti (ou no México, ou quem sabe dentro de cada um de nós...!) é preciso manter viva em cada sobrevivente a essência de que o Novo a ser construído costuma ser superior ao que outrora existia. É mais uma vez uma questão de olhar: olhar pra vida e pra história de cada um com a convicção de que "há tanta vida lá fora, aqui dentro sempre, como uma onda no mar...".

Re-publicação em homenagem ao querido Germano!

Eis aí a fórmula da sobrevivência, do reconstruir-se.
Vale a pena ler! É a minha crônica favorita: sensível e forte.

A ruína nos dá lições de vida.

Desabam prédios no centro da cidade do México num estrondoso terremoto. Racham pias, os espelhos se partem, água escura irrompe das paredes e tudo começa a afundar. Na rua os carros balançam igual gelatina, começa uma chuva apocalíptica de vidros e depois tijolos, ferro e pó, até que a morte se esconda sob os escombros.

Mas a todo instante nos chegam notícias de que bebês sobreviveram seis dias sob os destroços, casais resistiram sob os entulhos, e outros, apesar de desabarem inteiramente com os edifícios, chegaram ao solo intatos.

Então é lícito pensar que, embora muitos pereçam, a ruína nos dá lições de vida. Pois desabam os casamentos, os negócios, a saúde e os regimes, mas não se sabe de onde nem por que milagre surgem forças, propiciando o resgate e nos livrando do total aniquilamento.

Todos já estivemos e estaremos em algum terremoto. Um terremoto é quando a paisagem nos trai. Um terremoto é quando se quebrou a solidariedade entre o seu ponto de vista e as coisas. Um terremoto não é só quando o caos demoniacamente toma conta do cosmos. Um terremoto, eu lhe digo o que é: é a hora da traição da natureza. Ou da traição também dos homens, se quiserem. Um terremoto, minha amiga, é quando como agora você está se separando. Você me diz de soslaio, como que saindo, querendo-e-não-querendo conversar, você vai me dizendo que seu casamento está desmoronando. Você está embaixo da pele, com a voz meio sepultada lançando um grito de socorro, e aqui com a equipe de salvamento lhe posso apenas lançar a frase: a ruína nos dá lições de vida.
Terremoto é a hora da traição do amigo, que invejoso concorre como inimigo e lança fel onde a amizade era mel, e envenena a rima de seus dias sendo Caim em vez de Abel.

Por isto, há que afixar conselhos sobre a hora do terremoto. Como nos abrigos antiatômicos, nas indústrias do perigo, há que adiantar as medidas a serem tomadas quando o terremoto vier. Daí o primeiro conselho em caso de tal tragédia: não entre em pânico acima do tolerável. Lembre que todo terremoto é passageiro. Porque este é o sortilégio dos terremotos: nenhum terremoto é permanente, embora muitos e tanta coisa nele pereçam para sempre. Mesmo os mais profundos e autênticos cataclismos não duram mais que pouquíssimos, embora diabólicos, minutos. Vai ser terrível, mas vai passar.

Outro conselho: embora rápido e fulminante, nada garante que ele não torne a se repetir. Há que estar atento também para o fato de que esse movimento de terra é interior e exterior. O que desabou por cima não é tudo. É sintoma apenas do que se moveu por baixo. Naqueles terremotos do México, depois do primeiro e do segundo, as agências noticiaram um outro, mas que foi apenas subterrâneo. Diziam: é a acomodação das camadas geológicas. Incômoda acomodação é essa. Mas um terremoto autêntico vem mesmo das profundas e a superfície só vai se acalmar quando as camadas geológicas lá dentro se ajeitarem de novo.

Sobretudo, depois do terremoto há que aprender com as ruínas. Por que os engenheiros que me perdoem, mas a ruína é fundamental. É a hora do retorno. E se vocês me permitissem discretamente citar Heidegger, com ele eu diria que a ruína só é negativa para aquele que não entende a necessidade da demolição. Pois a tarefa do homem é refazer-se a partir de suas ruínas. Temos mais é que catar os cacos do caos, catar os cacos da casa, catar os cacos do país. Depois da demolição das fraudes, desmontando a aparência do ontem, poderemos nos erguer na luminosidade do ser. Ruína, neste sentido, não é decadência. Ao contrário: é a hipótese do soerguimento.

As ruínas do presente nos ensinam que um terremoto é quando não há mais o centro das coisas. E no México foi o centro, o centro do centro ¾ a capital, que foi arrasada. Mas aprendendo com a ruína, ali já nos prometem o verde. Já tracejam planos de jardins onde crianças e flores povoarão o amanhã.

Amigo, amiga: terremotos ocorrem sempre e muitos aí perecem. Mas a função do sobrevivente é sobreviver reconstruindo.

A ruína, além da morte, nos dá lições de vida.

Afonso Romano de Sant'Anna

25 de dez. de 2009

Feliz 2010, Arnaldo Jabor


O grande barato da vida é olhar para trás e sentir orgulho.
É viver cada momento e construir a felicidade aqui e agora.
Claro que a vida prega peças. O bolo não cresce, o pneu fura, chove demais (perdemos pessoas que amamos)...
Mas, pensa só: Tem graça viver sem rir de gargalhar, pelo menos uma vez ao dia?
Tem sentido estragar o dia por causa de uma discussão na ida pro trabalho?
Eu quero viver bem.... e você?

2009 foi um ano cheio. Foi cheio de coisas boas, mas também de problemas e desilusões, tristezas, perdas, reencontros.
Normal...
Às vezes, se espera demais. A grana que não veio, o amigo que decepcionou, o amor que acabou.
Normal...
2010 não vai ser diferente.
Muda o século, o milênio muda, mas o homem é cheio de imperfeições, a natureza tem sua personalidade que nem sempre é a que a gente deseja, mas, e aí? Fazer o quê? Acabar com o seu dia? Com seu bom humor? Com sua esperança?

O que eu desejo para todos nós é sabedoria. E que todos nós saibamos transformar tudo em uma boa experiência.
O nosso desejo não se realizou? Beleza... Não estava na hora, não deveria ser a melhor coisa para esse momento (me lembro sempre de uma frase que ouvi e adoro: "cuidado com seus desejos, eles podem se tornar realidade").
Chorar de dor, de solidão, de tristeza, faz parte do ser humano... Mas, se a gente se entende e permite olhar o outro e o mundo com generosidade, as coisas ficam diferentes.

Desejo para todo mundo esse olhar especial! 2010 pode ser um ano especial, se nosso olhar for diferente.

Pode ser muito legal, se entendermos nossas fragilidades e egoísmos e dermos a volta nisso. Somos fracos, mas podemos melhorar. Somos egoístas, mas podemos entender o outro.

2010 pode ser o bicho, o máximo, maravilhoso, lindo, especial! Depende de mim... de você.

Pode ser... e que seja!

17 de dez. de 2009

ELE carregou a nossa cruz!

Em época de Natal é comum o famoso "espírito natalino" deixar as pessoas mais sensibilizadas.
Mas importante mesmo é lembrar não só o nascimento de Cristo. Há um propósito muito maior: Ele se deu por nós! Então, é indevido pensar o nascimento sem a consciência da morte: Jesus já nasceu em sua própria cruz.
Por isso, gratidão eterna pelo que Jesus já fez e pelo que permanece a fazer todo dia (e não apenas no Natal!): nos dando acesso ao trono de Deus, transformando os vales em montes altos, enxugando nossas lágrimas e nos garantidno dias melhores.
Quem mais faria isso por mim e por você?
Diz assim a Palavra: Aquele que nem mesmo a seu próprio Filho poupou, antes, o entregou por todos nós, como nos não dará também com ele todas as coisas? (Rm. 8.32)
Concluo então que o Senhor ao nos dar Jesus não pretendia somente nos lavar dos nossos pecados, mas nos garantir vida abundante:
No trabalho
Na família
Nas amizades
Na saúde...
Ele é a verdadeira letra e luz, o verbo que se fez carne e o pai das luzes.
Então que o Natal e o Novo Ano sejam portas abertas para o melhor de Deus para você: provas, desilusões e lágrimas existirão, porém a convicção de que está tudo colaborando para o seu bem é que norteará o seu caminho.

Vídeo maravilhoso: Getsêmani, Leonardo Gonçalves
 

Voltar sem bagagem: outro tipo de leveza

Fim de ano, momento de repensarmos a vida, de olharmos com nostalgia o estranho relógio do tempo que, impaciente, insiste em correr.
Tenho em mim, e quem me conhece bem sabe disso, a virtude (em meio à multidão dos meus desacertos) de querer amar e construir vínculos com quem se aproxima, ou a quem me achego. Hoje, li um texto lindo e me emocionei bastante: é da Marta Medeiros e fala sobre valorizarmos as pessoas em detrimento daquilo que é material, passageiro. Penso que é urgente revisitarmos nossas prioridades, neste tempo onde estamos cada vez mais sós, ainda que acompanhados de pessoas e fartos (ou não!) de coisas.

  
No mural do colégio da minha filha encontrei um cartaz escrito por uma mãe, avisando que estava vendendo tudo o que ela tinha em casa, pois a família voltaria a morar nos Estados Unidos. O cartaz dava o endereço do bazar e o horário de atendimento. Uma outra mãe, ao meu lado, comentou:
.........._ Que coisa triste ter que vender tudo que se tem.
.........._Não é não, respondi, já passei por isso e é uma lição de vida.
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..........Morei uma época no Chile e, na hora de voltar ao Brasil, trouxe comigo apenas umas poucas gravuras, uns livros e uns tapetes. O resto vendi tudo, e por tudo entenda-se: fogão, camas, louça, liquidificador, sala de jantar, aparelho de som, tudo o que compõe uma casa. Como eu não conhecia muita gente na cidade, meu marido anunciou o bazar no seu local de trabalho e esperamos sentados que alguém aparecesse. Sentados no chão. O sofá foi o primeiro que se foi. Às vezes o interfone tocava às 11 da noite e era alguém que tinha ouvido comentar que ali estava se vendendo uma estante. Eu convidava pra subir e em dez minutos negociávamos um belo desconto. Além disso, eu sempre dava um abridor de vinho ou um saleiro de brinde, e lá se iam meus móveis e minhas bugigangas. Um troço maluco: estranhos entravam na minha casa e desfalcavam o meu lar, que a cada dia ficava mais nu, mais sem alma.
.
..........No penúltimo dia, ficamos só com o colchão no chão, a geladeira e a tevê. No último, só com o colchão, que o zelador comprou e, compreensivo, topou esperar a gente ir embora antes de buscar. Ganhou de brinde os travesseiros.
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..........Guardo esses últimos dias no Chile como o momento da minha vida em que aprendi a irrelevância de quase tudo o que é material. Nunca mais me apeguei a nada que não tivesse valor afetivo. Deixei de lado o zelo excessivo por coisas que foram feitas apenas para se usar, e não para se amar. Hoje me desfaço com facilidade de objetos, enquanto que torna-se cada vez mais difícil me afastar de pessoas que são ou foram importantes, não importa o tempo que estiveram presentes na minha vida. Desejo para essa mulher que está vendendo suas coisas para voltar aos Estados Unidos a mesma emoção que tive na minha última noite no Chile. Dormimos no mesmo colchão, eu, meu marido e minha filha, que na época tinha 2 anos de idade. As roupas já estavam guardadas nas malas. Fazia muito frio. Ao acordarmos, uma vizinha simpática nos ofereceu o café da manhã, já que não tínhamos nem uma xícara em casa.
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..........Fomos embora carregando apenas o que havíamos vivido, levando as emoções todas: nenhuma recordação foi vendida ou entregue como brinde. Não pagamos excesso de bagagem e chegamos aqui com outro tipo de leveza.

Eternamente Drummond

Com uma ampla obra que transita entre a poesia e o conto, Drummond escreveu incansavelmente até o fim de sua vida. Uma mente tão criativa e produtiva que, mesmo depois de sua morte, ainda foram lançados diversos materiais inéditos de sua autoria.





Adélia Prado



(Tela de W. Maguetas)

Minha alma é um bolso onde guardo minhas memórias vivas.
Memórias vivas são aquelas que continuam presentes no corpo.
Uma vez lembradas, o corpo ri, chora, comove-se, dança...
"O que a memória amou fica eterno."
Adélia Prado

http://renataemessencia.blogspot.com/search/label/Ad%C3%A9lia%20Prado

Literatura sem pausa

Olá, pessoal!

Estão aí, sorrindo para nós, as tão esperadas férias.
Verdade é que anseávamos por elas!

Trabalho hoje com Literatura e confesso à vocês que prazer literário se se resumir à sala de aula não é verdade, não é voz com palavras, suspiro de alma, seja para chorar, sorrir ou protestar. Aqui, torna-se obrigatório citar o grande Machado de Assis: "Só se faz bem o que se faz com amor".  
E eu espero estar fazendo bem o meu trabalho!

Bem, encontrei, vasculhando uns blogs, uma indicação maravilhosa de vídeo sobre o poeta João Cabral de Melo Neto, um documentário produzido pela editora Alfaguara para comemorar o relançamento da obra do poeta, com depoimentos de Luis Fernando Verissimo, Chico Buarque, Lázaro Ramos, Ferreira Gullar, Adriana Calcanhotto, Carlos Heitor Cony, Adélia Prado e outros.

Veja aí:



15 de dez. de 2009

Provinha do Ensino Médio

Pessoal,

Volto a lembrá-los que nossa última avaliação será sobre Figuras de Linguagem, no contexto da Literatura. Os 1ºs Anos B e C deverão se preparar com base nos exercícios trabalhados em sala (há um post aqui no blog sobre as Figuras que vocês verão na prova).
O 1º A permanece revendo as características dos movimentos Barroco e Arcadismo.

Boa prova!
Estude, garotada!

14 de dez. de 2009

QUEM MORRE?, (Marta Medeiros)


Morre lentamente
Quem não viaja,
Quem não lê,
Quem não ouve música,
Quem não encontra graça em si mesmo

Morre lentamente
Quem destrói seu amor próprio,
Quem não se deixa ajudar.

Morre lentamente
Quem se transforma em escravo do hábito
Repetindo todos os dias os mesmos trajetos,
Quem não muda de marca,
Não se arrisca a vestir uma nova cor ou
Não conversa com quem não conhece.

Morre lentamente
Quem evita uma paixão e seu redemoinho de emoções,

Justamente as que resgatam o brilho dos
Olhos e os corações aos tropeços.

Morre lentamente
Quem não vira a mesa quando está infeliz
Com o seu trabalho, ou amor,
Quem não arrisca o certo pelo incerto
Para ir atrás de um sonho,
Quem não se permite, pelo menos uma vez na vida, 

Fugir dos conselhos sensatos...

Viva hoje !
Arrisque hoje !
Faça hoje !
Não se deixe morrer lentamente !

NÃO SE ESQUEÇA DE SER FELIZ

3 de dez. de 2009

Vídeo e comentário interessantes sobre o movimento Barroco



Esse vídeo remete a MUITAS coisas do estilo de época que o Barroco é: a representação do ser humano como algo impotente em relação ao mundo (ele é uma criança, um bebê), e que, submetido às intenções divinas (a asa de anjo que vem do alto), passa por uma fragmentação na sua própria identidade (mente - espírito - e corpo se separam, sendo o destino deste sofrer). Com essa fragmentação, o corpo é jogado ao inferno (e lá o movimento dos corpos sem cabeça praticando sexo mostram a associação que se faz entre sexo e pecado) e a cabeça - símbolo do espírito e da mente - é alçada ao céu, onde se cristaliza, torna-se eterna. Perceba, também, que nesta eternidade, a expressão dos anjinhos que se formam no céu é infeliz, sofrida, retorcida. Essa infelicidade é marcante no Barroco, visto que em sua visão de mundo o destino do homem é o sofrimento, sofrimento que vem de sua condição frágil e passageira na Terra. Ao contrário do Classicismo, movimento anterior, o Barroco é teocêntrico. Ele não acredita mais no poder humano de dirigir a própria vida, mas sim no fato de o ser humano estar submisso a uma entidade maior, que o controla por completo: Deus.
Esse modo de ver o mundo, profundamente pessimista, não é só fruto da revisão que o Barroco faz dos princípios do Classicismo. Ele também se coordena com o momento histórico que se vive na Europa e no Brasil. O Barroco coincide com o acirramento da Contra-Reforma em todos os países de maioria católica (Espanha e Portugal, principalmente, e também a Itália). Esse acirramento promoveu um sentimento de histeria coletiva profunda. Havia um policiamento ideológico e cultural tão fortes que as pessoas o tempo todo se policiavam para não cometerem atos que pudessem levar a uma denúncia ao Tribunal do Santo Ofício (conhecido também como Santa Inquisição). Era um período em que tudo o que se falasse e fizesse, em público ou na vida privada poderia ser usado contra as pessoas no tribunal. E até levar à condenção à morte.
Esse pessimismo, essa infelicidade, esse policiamento religioso vão resultar, na arte, numa fascinação pelo grotesco, característica que chamamos de feísmo. É uma característica do vídeo também: ver aquela degolação do bebê e o corpo cair, sem cabeça, engolido pela terra e, por fim, pilhas de corpos sem cabeça praticando sexo é uma coisa muito bizarra. Outra consequência é a angústia diante da vida, da inconstância das coisas que nos cercam, da inconstância do próprio homem, que está destinado a morrer. E, por fim, mais uma, que se nota particularmente no plano da linguagem, é a tensão das coisas do mundo em planos opostos.
Como assim? É o seguinte. O homem barroco, como qualquer outro, quer ser feliz. Não pense nele como um emo deprimido que adora chorar. Não, ele quer aproveitar o corpo, os prazeres mundanos, acreditar no poder do homem. Mas por uma questão religiosa, ele tem uma noção de que esses elementos são falsos. O corpo e os prazeres que ele pode dar são passageiros e levarão à perdição da alma, porque estão ligados ao pecado. Para salvar-se, o homem precisa valorizar o que está ligado à vida eterna, ao espírito. Então ele tenta conciliar estas duas dimensões, corpo e espírito, e aquilo que estará associado a elas: efêmero e eterno, pecado e salvação, inferno e paraíso. Tenta, mas não consegue resolver isso de forma satisfatória. Ou ele se resolve pela salvação (abandonando a realidade do corpo), ou demonstra sua insatisfação pelo fato de as coisas serem instáveis.
Por isso, no plano da linguagem, o movimento Barroco vai usar (e abusar) do uso da antítese, do paradoxo e de uma outra figura de linguagem: o hipérbato. Já que a existência dele é polarizada em coisas opostas, ele vai demonstrar isso através da oposição de idéias (antítese) e da criação de uma realidade contraditória e ilógica, em que as coisas opostas convivem ao mesmo tempo no mesmo ser (paradoxo). Assim ele assinala os conflitos da existência humana no plano da linguagem. E para mostar como é difícil para ele entender e organizar as impressões que ele tem deste mundo que o cerca, tão contraditório a si mesmo, ele usa o hipérbato, que consiste na inversão dos termos que formam uma oração.
Não entendeu o hipérbato? Lembre do Hino Nacional. Tente cantar os primeiros versos em ordem direta: "As margens plácidas do Ipiranga ouviram / O brado retumbante de um povo heróico". Sem ritmo, não é? É, é que além de demonstrar essa dificuldade de organização do mundo ao redor (esse é um uso particular do movimento Barroco) a inversão, ou hipérbato, auxiliam a manter o ritmo e a musicalidade de um texto, garantindo sua métrica e sua rima, por exemplo.

http://literarizando.blogspot.com/2008/05/barroco-pessimismo-e-religiosidade.html
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